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"Se não insistires e persistires, nunca vais vencer"

Paulo Azevedo

Nasceu sem braços e pernas, o que o obriga a usar uma prótese para caminhar, mas não tem nenhum receio de "despir-se" e mostrar as suas deficiências. Visitou Angola pela primeira vez para dizer às pessoas que ser diferente é normal.

O que o trouxe a Angola?
É a primeira vez que visito o País. Quem me permitiu concretizar este sonho foi a Bonws Seguros que conheceu o meu trabalho e achou importante passar um pouco da minha experiência aos angolanos.

Além da palestra tem agendadas visitas?
Sim, visitei o centro de acolhimento Arnaldo Jansen "Padre Horácio", foi um momento único e fantástico para mim. Fui conhecer as instalações, mas, acima de tudo, falar com os meninos e mostrar-lhes que ser diferente não é ser inferior, que se eles acreditarem nos seus próprios valores podem fazer coisas impressionantes.

Quando é que o percebeu que ser diferente é ser normal, numa sociedade preconceituosa?
Cresci a ouvir das pessoas "coitadinho, mais valia não ter nascido", porque a minha família não me escondia. Aprendi a ganhar forças nessa frase e assumi um compromisso comigo mesmo: "sou eu que vos vou mostrar se valeu apena ou não". Acho que este é o segredo: aceitar-se a si.

Como foi usar a sua deficiência para ajudar as outras pessoas, com deficiência física ou não?
Isto surgiu de uma forma que eu não estava a espera. Em Portugal escreveram um livro sobre a minha vida e comecei a apresenta-lo às escolas. Começou a ficar mais sério quando percebi que, se calhar, as pessoas olhavam para mim de uma forma como um exemplo: "se ele consegue, eu também consigo". Então comecei a usar isso para fazer a diferença na vida das pessoas.

Conta com apoios para as actividades que realiza?
Em Portugal começou por conta própria, mas agora vivo disto. Comecei a fazer as palestras a nível de empresas, mas se tivesse apoio conseguia estar em escolas e instituições para para passar a minha palavra. Mas para isso, preciso de apoio financeiro.

Foi fácil conseguir membros para a associação "Eu Desafio-te"?
Reuni os meus amigos, porque quando conto a minha história falo de heróis da vida real, e muitos deles são os meus amigos. Tudo o que angariamos tem que ser para ajudar e não para proveito próprio, como muitos fazem.

Durante a apresentação da associação falou do papel das famílias...
Este é o meu foco principal, mostrar que aquele filho ou neto deficiente tem valor. O objectivo é mudar a mente da família e proporcionar momentos de lazer, porque muitas vezes, uma criança numa cadeira de rodas, quando for adulto não volta a andar e torna-se mais pesado, a família cansa-se. Então, programamos dias de férias a estas famílias e com pessoas para cuidar das crianças.

Percebe mudanças significativas com as suas palestras, no que toca a arquitectura urbana, por exemplo?
Luto para as mudanças, mas é uma luta inglória, porque nem toda gente faz aquilo que é necessário. A maior barreira arquitectónica é a mente. Temos que deixar de olhar para as pessoas e deixar de vê-las como as minorias, como a parte fraca, seja por deficiência ou por orientação sexual, seja o que for, temos que olhar para as pessoas de igual para igual.

É fácil conciliar as actividades de actor e orador?
Agora só faço apenas as palestras na "mesa da superação"... É assim que lhe chamo porque faço as palestras em cima de uma mesa. E neste momento não me vejo a fazer outra coisa.

Como é que ajuda as pessoas a terem independência económica?
Digo-lhes para não terem medo de arriscar. O principal ponto para qualquer independência é sentir-se a vontade de tentar, porque vão dizer que NÃO umas 30 vezes, mas se não insistires e persistires, nunca vais vencer. Quando caímos, não somos nós que decidimos cair, mas a decisão de nos levantarmos é nossa.

Sem pernas e braços, apenas uma "mesa da superação"

O português Paulo Azevedo percebeu desde cedo que tinha que gostar e respeitar-se a si próprio para exigir o mesmo dos outros. Apesar da deficiência, a família nunca se envergonhou e levava-o onde fosse.

E permitiu ao Paulo ser actor e orador de palestras para dizer que "ser diferente é ser normal". Hoje, é pai de dois filhos e vive das receitas das palestras. É licenciado em jornalismo e fez uma especialização em motivação de futebol, no Real Madrid.

Gosta de fazer desporto, sobretudo o surf. Estar com os filhos é outra ocupação nos tempos livres. Também gosta de ler, ir ao cinema, mas principalmente, gosta "de sorrir".

Até ao momento, Angola é o único País que recebeu a "mesa da superação", como Paulo apelidou as suas palestras. Em Luanda teve a oportunidade de dividir o palco com o João das Dores Chiquete, atleta da selecção nacional em futebol adaptado, para passarem o testemunho de superação, apesar das deficiências físicas.


(artigo publicado na edição 503 do Expansão, de sexta-feira, dia 14 de Dezembro de 2018, disponível em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)