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"Por causa da crise não tive apoio do INAGBE no mestrado"

Entrevista a LUMONANSONI ANDRÉ, ESTUDANTE QUADRO DE HONRA NA RÚSSIA

Angola integra os quadros de Excelência da Universidade Estatal de Tula, na Rússia, graças a Lumonansoni André. Por não ter notas inferiores a 20, o jovem encontrou na Federação Russa o apoio financeiro que não conseguiu em Angola.

Que significado tem para si a "pedra de honra"?
A "pedra de honra" não foi apenas para mim, mas para todos os 279 Mestres com excelência e elevado desempenho académico. Ela representa a dignidade, respeito, reconhecimento e, acima de tudo, o poder intelectual do povo angolano. É um sinal de compromisso com a Nação e o mundo, que saberás servir com zelo e dignidade, nunca traindo a universidade e os seus valores.

Qual é a sensação de receber um diploma vermelho?
Fiquei mais feliz por Angola do que por mim, porque na Universidade Estatal de Tula, cada país ou povo tem, pelo menos, um representante no quadro de Excelência, e Angola não tinha. Tal facto doía-me muito. Como angolano, queria registar essa historia e, graças a Deus, isso aconteceu em 2017, quando terminei a licenciatura com o diploma vermelho, sendo o primeiro angolano e o primeiro da lusofonia na área da engenheira a ter esta tão desejada distinção. No mestrado tive a mesma distinção e venci o concurso de melhor estudante da universidade, sendo o primeiro estrangeiro a ser eleito melhor estudante do Ano.

Qual é a fórmula para não ter outras notas senão 20 na licenciatura e no mestrado?
Não há nenhuma fórmula mágica, se não a responsabilidade de sacrificar-se para fazer bem aquilo que nos tirou do nosso país e compensar o esforço que os pais fazem para nos manter lá.

O seu projecto da licenciatura foi implementado numa subestação eléctrica da Rússia. De Angola, já recebeu alguma proposta?
Ainda não. Creio que deveu-se ao facto de ter estado na Rússia a concluir o mestrado. Aquando da visita de Sua Excelência João Lourenço à Rússia, recebi dele e de outros dirigentes angolanos apoio moral e manifestaram a disponibilidade de apoiar-me assim que regressasse. Estou em Angola há poucos dias e tenho certeza que terei o apoio possível das instituições e do Governo.

Estudou como bolseiro?
Durante a minha licenciatura fui bolseiro do INAGBE, mas no mestrado fui bolseiro do Governo da Federação da Rússia.

Que dificuldades encontrou?
Tive dificuldades com o desaparecimento físico do meu pai, no princípio da licenciatura; com a língua russa, no primeiro ano; e tive dificuldades financeiras no mestrado. Foi muito difícil, porque havia trabalhos que queria fazer durante o mestrado e não consegui por falta de dinheiro.

Recebeu apoio de alguma instituição nacional?
Infelizmente não, mas foi incrível como a universidade, sendo russa, me apoiou em todas as pesquisas, incluindo a despesa da minha dissertação de mestrado, na qualidade de melhor estudante da instituição. Por isso, estarei eternamente grato.

Foi o único angolano no curso de Electroenergética e Electrotecnia?
Fui o único angolano e o único estrangeiro nessa especialidade na Universidade Estatal de Tula.

Teve de abdicar de algo para se dedicar aos estudos?
Sim, tive de desfazer-me de muitas coisas que uma pessoa da minha faixa etária deve gozar, por direito. Afastei-me das elites de futebol, porque gosto muito de jogar bola e acredito que se não fosse engenheiro seria um grande futebolista. Fiquei distante da família quase oito anos. Perdi amigos, porque me isolava. Não aproveitei da melhor forma a infância porque comecei a ter amor pelos estudos aos 10 anos e isso custou-me muito caro.

Considera-se um génio?
Não e nem gosto de ser, sou muito feliz por ser apenas o Lumonansoni, apesar de ter um QI de 151,8518518519, que para muitos já faz parte da classe dos génios.

Como vê a área das energias no País?
Nos últimos 10 anos em que estive fora do País, tenho acompanhado os esforços do Executivo no melhoramento do sector energético, posso assim afirmar que houve evoluções significativas, o que é louvável, mas há muito o que fazer. O sucesso das energias renováveis dependerá da vontade do Executivo, porque o País tem condições favoráveis. Angola pode abastecer as suas cidades, comunidades rurais e ainda terá capacidade para fornecer alguns países vizinhos.

Como irá dar o seu contributo?
Não é apenas um dever, mas obrigação, de modo a ver o País onde sempre sonhei, isto é, no topo das potências mundiais em termos de ciência e tecnologia. Gostava de trabalhar nas empresas de telecomunicações e tecnologias de informação e também nas empresas de energia.

A crise em Angola teve impacto na sua formação?
Muito. Foi por causa da crise, e talvez por outras razões que desconheço, que não mereci a bolsa do INAGBE no mestrado. Felizmente, fiz o mestrado com uma bolsa de mérito oferecida pelo governo russo, quando tive o diploma vermelho na licenciatura. Mas, pelo facto de a bolsa cobrir apenas as propinas, concorri à bolsa do INAGBE, fui seleccionado, mas por causa da crise foi cancelado o envio de estudantes para o exterior. A minha mãe não tem possibilidades de cobrir essas despesas, mas para não perder a oportunidade que o governo russo me ofereceu, tive de continuar a estudar mesmo sem a bolsa do governo angolano. Claro que faltava tudo, mas sabia que era um sofrimento temporário, que o mais importante é a formação e que com ela poderei fazer parte da solução dos problemas que o País enfrenta.

Como vê o estado económico actual do País?
É preocupante, mas o que me tranquiliza é o visível esforço do Executivo, em especial do Presidente João Lourenço, pela forma sábia como tem dirigido os destinos do País, nomeadamente, o combate à corrupção, nepotismo e bajulação, que fizeram com que o País estivesse mergulhado nesta situação.

Estudante "exemplar" propõe academia de ciência angolana

Lumonansoni Eduardo André nasceu a 10 de Julho de 1992, no município de Kilamba Kiaxi, Luanda. O "cassule" entre 6 irmãos foi distinguido como melhor aluno de Electroenergética e Electrotecnia, na Universidade Estatal de Tula, Rússia. O jovem, que ocupa os tempos livres a estudar matemática e física e a jogar futebol, teve nos familiares, namorada e amigos o apoio que necessitava. Conforme diz, os investimentos em energias renováveis não devem ser entendidos como um custo, mas como uma oportunidade para se assumir o compromisso de solidariedade com as gerações que asseguram o futuro. O estudante destaca que o País precisa de perceber que a solução dos seus problemas está nas mãos da ciência. "Defendo que se analise a criação de uma academia de ciência angolana, que será o centro do desenvolvimento e produção científica do País, com a ajuda das melhores mentes de Angola, de modo a produzir conhecimento e soluções que melhorem a vida das pessoas", afirma.