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Angola

"A economia de mercado não existe em Angola. O mercado é o Estado"

Grande Entrevista a YURI QUIXINA, PROFESSOR UNIVERSITÁRIO

Assume-se como economista liberal convicto e defende uma mudança da matriz da nossa economia. O Estado tem que deixar espaço para os privados poderem crescer. Diz também que a reforma estrutural continua adiada e a mudança começa nas pessoas.

Angola confirma o quarto ano de recessão económica. Não se notam melhorias mesmo com mudanças nestes dois últimos anos e a entrada do FMI. Afinal o que é que o País precisa para alavancar o seu crescimento económico?
Angola precisa muito mais de uma transformação estrutural do que reforma estrutural. São coisas muito diferentes. Reforma estrutural são pequenas coisas, que se aplicam por exemplo a Portugal, Grécia ou Irlanda, em que os países ganham rapidamente competitividade. Isso acontece quando o Estado entra muito na economia, aumenta os custos das empresas, engorda as estruturas. Depois há que fazer algumas alterações, privatizar coisas, liberalizar sectores, transformar os menos produtivos em mais produtivos, combater os salários ineficientes, quem produz mais ganha mais, etc.

O País também precisa disto...
Claro. Mas o que Angola precisa mesmo é de uma transformação estrutural. E isso está ligado à mentalidade, à atitude. Não são só as políticas que mudam as coisas. Transformação estrutural está ligada aos valores. Se analisarmos com atenção, no fim de uma crise de valores vem sempre uma crise económica. Aconteceu nos Estados Unidos, na Europa. Primeiro crise de valores, depois crise económica.

É o que está a acontecer em Angola?
Em Angola os valores foram embora com aquele "boom" do dinheiro fácil e barato. Era de uma arrogância enorme, o pai do outro já não era o teu pai, a mãe do outro já não é a tua mãe, perdeu-se o respeito e a solidariedade, perderam-se os valores que existiam antes de 2002. Crise de valores é o consumismo. Crise de valores é crédito fácil e barato, é o excesso de ministérios que não fazem nada, é uma ilusão que se cria nas pessoas. E isso é sempre alimentado por um financiamento ou por uma dívida. No nosso caso foi a dívida da China e o dinheiro fácil do petróleo.

Essas foram causas para o que estamos a viver agora?
A causa maior é o modelo económico, cuja matriz era o consumo. Porque é o único instrumento capaz de manter o poder político. Porque o consumo dá a ideia que estamos a andar bem, mas isso é apenas no curto prazo. Como veio a acontecer. Por exemplo, todos os indicadores económicos interessantes que tínhamos eram artificiais. O crescimento económico era artificial. Nunca tivemos um período de ouro na nossa economia. Isso era artificial. O que tivemos foi um período de oportunidade perdida para mudar o modelo produtivo, que devia estar virado para o sector privado como motor da economia.

Acha que isso fazia parte de uma estratégia ou foi acontecendo porque os dirigentes se deslumbraram com tanto dinheiro?
Todos os países que vieram de um modelo com matriz socialista/ comunista caíram nisso. Depois veio uma crise para restaurar. Basta olhar para o que aconteceu nos países de Leste europeu. Os únicos que não passaram por isso foram os que mandaram os jovens estudar para fora e que tiveram contacto com o modelo liberal americano. Estou a falar da Estónia ou da Lituânia, por exemplo.

Trouxeram novas ideias para as suas economias.
Se repararem, estes países quando começaram a reestruturar as suas economias, a primeira coisa que fizeram foi reduzir a taxa tributária. Baixar os impostos ao mínimo para atrair mais pessoas, mais empreendedores para o sector produtivo, maior dimensão ao sector privado que é o verdadeiro motor da economia. Houve até alguns que se tornaram paraísos fiscais.

Em Angola os impostos estão a aumentar todos os dias. Tem sido ao contrário.
É verdade, não fizemos nada disso. Apenas mudámos a roupa, o corpo foi sempre velho, com as características do modelo socialista. A mentalidade da loja para o dirigente e a loja para o povo não mudou em 1992 e mantém-se até hoje. Mesmo não trabalhando tínhamos dinheiro. O País tem que mudar o modelo. Por exemplo, os discursos dos dirigentes deviam sair do macro e ser mais micro. Devem apelar ao espírito do trabalho, ao amor aos resultados, à solidariedade e confiança... (...)


(Leia o artigo integral na edição 557 do Expansão, de sexta-feira, dia 17 de Janeiro de 2020, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)