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Angola

"As políticas de governação nunca colocaram o angolano no centro das preocupações"

Grande Entrevista a TÂNIA DE CARVALHO, SOCIÓLOGA

Tânia de Carvalho faz parte de uma nova geração que exerce o seu direito de cidadania de forma plena, opinando e criticando o passado, mas olhando para o futuro com esperança. "Fizeram-nos acreditar que com a actual governação podemos caminhar juntos e encontrar novas soluções", diz.

O desenvolvimento do País é um desafio económico ou social?
Os dois, mas fundamentalmente social. O económico dói mais, sentimos na pele. Depois do alcance da Paz habituámo-nos a "pegar" nuns dólares e a gastar. Mas nunca tivemos preocupados com o mais importante - as pessoas. As políticas de governação nunca colocaram o angolano no centro das preocupações. Por isso assistimos ao egocentrismo, ao roubo, à delapidação dos recursos. Tudo menos a resolução dos problemas sociais.

Mas o desafio económico é também muito importante.
Entendo a economia como forma para ir buscar o dinheiro para investir no homem. De forma directa nas condições sociais - escola, saúde, habitação, saneamento básico - e isso não fizemos.

Como é que se faz esse investimento social?
Somos cerca de 28 milhões de angolanos, maioritariamente jovens e mulheres. Se colocássemos o cidadão no centro das preocupações, devíamos desenvolver políticas para essas duas faixas populacionais. Temos uma taxa de mortalidade elevadíssima entre os 0-5 anos de idade, e na verdade não há uma política de apoio materno-infantil. Se não há água potável não há possibilidade de ter uma política de saúde reprodutiva para a mulher, não há condições de cuidar das crianças, das condições imunológicas. Sem água potável as escolas não podem funcionar convenientemente. Não há creches comunitárias...

São necessárias políticas voltadas para a mulher?
Não existem. Vemos que na verdade quem sustenta a economia nacional é a economia informal. Quais as políticas que apoiam as vendedoras ambulantes? São vistas como marginais ou potenciais empreendedoras? Muitas delas não têm bilhete de identidade e quem não tem bilhete de identidade não conta. Nem contribui. Tentou-se criar o cartão de vendedor ambulante, gastou- -se muito dinheiro em urinóis públicos para apoiar os vendedores ambulantes, hoje não funciona nenhum. E ninguém é responsabilizado.

A responsabilização é um problema do País?
Agora podemos perceber o que nos fizeram. E digo "nos" porque lhes demos a maioria, votámos no partido da situação, estamos envolvidos. Hoje temos essa luta contra a corrupção, nepotismo, branqueamento de capitais, responsabilização das pessoas. Fizeram-nos acreditar que com a actual governação podemos caminhar juntos e encontrar novas soluções.

Cada vez que se tenta responsabilizar alguém lá vem a conversa que é contra nós. Ninguém admite ser avaliado...
É uma questão de mentalidade. O facto de não haver responsabilização é que levou à situação que hoje conhecemos. Se formos analíticos, houve dois sectores que mais contribuíram para a delapidação do erário público - a construção civil e o petróleo. O primeiro porque percebemos que tínhamos de reconstruir as infra-estruturas que foram partidas durante anos. Esse "boom" da construção civil trouxe também uma outra realidade - foi o sector de onde se retirou mais dinheiro de forma ilícita.

E relativamente ao sector petrolífero?
No sector petrolífero não estão preparados para grandes críticas. São um sector de elite, não se consegue implantar um factor de responsabilização. Ainda recentemente fiz um comentário sobre o projecto LNG, e preferiram atacar o mensageiro e não a mensagem. Não sou uma especialista, mas sou uma cidadã que tem direito a uma opinião e deve estar preocupado com o controlo da forma como gastam o nosso dinheiro. (...)


(Leia a entrevista integral na edição 562 do Expansão, de sexta-feira, dia 21 de Fevereiro de 2020, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)