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Opinião

"Maldita" cultura

Editorial

A moratória no pagamento da dívida à China abre novas perspectivas para equilíbrio financeiro do País a curto prazo e, indiscutivelmente, representa uma vitória. Um balão de oxigénio para a tesouraria do Estado que passa por enormes dificuldades, apesar de ter pela frente enormes desafios, de onde se destacam as necessidades de capitalização em algumas empresas públicas, onde o BPC assume um particular destaque.

Exige-se, por isso, mais do que nunca, equilíbrio sensato na gestão dos nossos dinheiros. Em tempos passados, estas folgas acabaram por resultar em maiores dívidas para o futuro, ao jeito "afinal já posso voltar a gastar". A esperança é que a lição tenha sido absorvida, embora existam sinais preocupantes.

O Estado não pode continuar a gastar milhões de dólares na compra de imóveis para as mais diversas instituições quando tem dezenas de edifícios devolutos, a precisar apenas de obras e recuperação. Esta "maldita" cultura de comprar tudo novo, de não investir em serviços de manutenção, de não ter o hábito do aproveitamento do património e equipamentos, faz com que para garantir um serviço por um período de 10 ou 15 anos se gaste três vezes mais do que acontece na maioria dos países. O verbo comprar está no discurso da maioria dos nossos dirigentes, mas o verbo arranjar raramente se ouve. A ideia de que o Estado tem um pote de ouro inesgotável ainda é dominante.


Um exemplo que reflecte esta "maldita" cultura: se olharmos para as administrações municipais ou governos provinciais, há quase sempre mais fiscais para andarem atrás das zungueiras ou dos proprietários de carros que são lavados na via pública, do que serviços técnicos para reparar as infra-estruturas instaladas. Quantas empresas públicas de grande dimensão têm equipas próprias para reparar e fazer a manutenção de equipamentos tão simples como o ar condicionado, a fotocopiadora ou o computador? Se houver um problema chama-se um amigo, e se este não resolver, compra-se outro. Veja-se o que aconteceu com os semáforos da baixa de Luanda, compraram-se centenas e, em cinco anos, muitos já não acendem. E as palmeiras das principais avenidas da capital, plantadas pelo menos quatro vezes na última década, ninguém regou, e secaram. Compraram-se outras. E as estradas? E os prédios? E....?

Por isso, neste momento de alguma folga financeira, vamos em vez de comprar novo, investir em quem saiba arranjar e ajude a manter o usado. Reconheço que existe uma classe de dirigentes e gestores que nunca vai perceber isso e que acha mesmo um desrespeito deixar de exibir coisas a estrear, que não é capaz de suster este impulso consumista. Nem na sua vida pessoal. Pergunto-me é quem criou esta maldita cultura de comprar com pompa e circunstância e só depois pensar como se vai pagar. E quando falamos de erário público, muitas vezes, nem se olha para o preço.