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Opinião

Unanimidade

Editorial

Tenho um amigo que repete sempre "a unanimidade é burra". Quando todos estão de acordo, ou falta capacidade intelectual para debater o assunto ou falta coragem para se dizer o que se pensa. No limite, até podem estar todos de acordo, mas não há ninguém tão iluminado que tenha sempre razão. Essa ideia de quem se senta no degrau acima tem a capacidade de tomar sempre as decisões certas é muitas vezes alimentada por quem se senta nos degraus abaixo. Por preguiça, não vale a pena contrariar, por medo, ainda me vão prejudicar, ou mesmo por incapacidade, "sei lá o que ele está a dizer". Por isso, e sem querer poupar nas palavras, quem concorda sempre com tudo, ou é preguiçoso, ou cobarde, ou então incapaz.

Estas qualidades são também estimuladas por quem se senta no degrau acima. Porque não está disposto a ouvir opiniões diferentes. No bom estilo "norte-coreano", se pensa diferente então está contra mim. Esta ideia que vem de cima e que não se quebra na nossa sociedade, de achar que para serem dos nossos têm que pensar como eu, embrutece o pensamento intelectual de um País e limita o seu desenvolvimento. Foi assim durante muitos anos e tem mudado muito pouco.

Ter sempre razão e acreditar nisso, cria uma áurea inebriante de intocável, de perfeição quase divina, capaz de suportar uma atitude que com os tempos assume contornos insuportáveis de autismo que levam inevitavelmente à solidão, numa primeira fase, e a uma queda estrondosa, no final. Esta é a lição que chega de muitas partes do mundo.

Por isso, para quem está sentado no degrau de cima deve estimular o debate entre os seus, ter capacidade de ouvir e de explicar os seus argumentos. Isso também obriga a reforçar as convicções. E nas mais diversas actividades que estão sob a sua tutela deve "obrigar" a que nada seja único, unânime. Isso não significa divisão, pelo contrário, entre cidadãos embutidos dos mesmos valores e das mesmas convicções, a disputa não cria distâncias, estimula a união.

Sou sempre a favor de vários candidatos para um lugar, de vários projectos para uma mesma realização, de várias opiniões para uma decisão. Mas isso implica naturalmente estar preparado para ver o seu candidato perder, o seu projecto ser preterido e a sua opinião não ser a decisão final. E infelizmente o véu de divindade que muitos escolhem usar não lhes dá a humildade suficiente de serem contrariados. E o caminho mais fácil é a unanimidade. Dá menos trabalho. Mas infelizmente para todos não garante melhores resultados. E é mais ou menos assim que estamos.