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Opinião

Qual a real situação económica de Angola: recessão ou estagflação?

Alves da Rocha

Ainda hoje não se tem a certeza quanto aos dados estatísticos do comportamento da economia em 2016, recusando-se o Governo a aceitar que nesse ano o PIB tenha estado em recessão real: ou -3,6% segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), ou -0,7% de acordo com os últimos dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) relativos ao com portamento da economia mundial em Outubro do corrente ano. As instituições do Estado insistem no valor 0,1% para o crescimento económico no ano passado, correspondendo 1,2% para o não petrolífero.
Evidentemente, que não são indiferentes aquelas cifras: o seu significado é preciso quando se tomam umas ou outras e a sua influência para a definição de objectivos de política económica é claramente relevante. Por exemplo, considerando as estimativas do INE, o Produto Interno Bruto (PIB) não petrolífero pode ter apresentado um comportamento de -5,5%, considerando -2,3% para o PIB petrolífero e uma proporção do petróleo no global de 23,9% - proporções estimadas a partir do Relatório de Fundamentação do Orçamento Geral do Estado (OGE) 2017. Seja como for, nenhuma das estimativas está em linha nem com a diversificação da economia, nem com o sucesso da política de agravamento aduaneiro para se substituírem importações de bens finais.
Quando há diversificação, as economias crescem e transformam esse crescimento em desenvolvimento. Quando existe substituição de importações, também as oportunidades de aumento da produção doméstica manifestam-se, ainda que de uma forma não competitiva, porque sempre auxiliadas por preços artificiais e afastados dos que, por ora e no quadro das Teorias Económicas do Comércio Externo, são tidos como de eficiência. Ou seja, nestes casos, a substituição de importações/aumento da produção interna apresenta custos de oportunidade elevados.
Porém, desde 2009, que a economia angolana apresenta registos médios anuais de crescimento modestos e, depois de 2014, entrou numa fase perigosa de recessão do seu comportamento (ver tabela).
Mas mesmo que se considerem, ipsis verbis, os dados oficiais, a situação não muda grandemente de figura, em termos efectivos e estruturais, pois as respostas internas aos estímulos artificiais de competitividade e abertura da economia, não têm produzido os efeitos esperados e seguramente desejados por todos.
Ainda num contexto de substituição de importações com resposta humilde da produção nacional a esse estímulo, a subida generalizada dos preços pode ser a resposta dos mecanismos de mercado equilibradores da oferta e da procura. A não ser a fixação administrativa dos preços e a generalização de subsídios preponderem sobre os mecanismos de mercado.
Sempre que o comportamento dos preços for insensível a uma redução da procura nominal global, as economias começam a experimentar o fenómeno da estagflação, consequencializando uma baixa do seu valor real (ver gráfico).
Depois de um período de desaceleração do ritmo de aumento do nível geral dos preços, graças a uma política cambial de sobrevalorização da moeda nacional e num quadro de elevada dependência das importações (de todo o tipo, bens finais, intermédios e de capital). A subida do PIB nominal em 2017 (estimativas do Governo) pode permitir a redução do hiato inflação/produto, já que se prevê (cálculos meus baseados no comportamento da inflação durante os primeiros 10 meses do ano) uma taxa de inflação de 34,3% para 2017. Mas ainda assim, a brecha em relação à produção real e efectiva continua muito alta.
Sempre que a inflação apresentar uma tendência forte de se instalar na economia - e está-se a viver de novo este risco - toda a política tendente a controlá-la através de uma acção restritiva sobre a procura monetária, implicará a aceitação de um sacrifício sobre as variáveis reais (o PIB e o emprego).
O problema da inflação em Angola não é apenas de controlo da política monetária - a base monetária - mas essencialmente de crescimento económico ou de aumento da oferta agregada. Percebe-se a existência de uma antinomia - talvez mesmo contradição - entre crescimento e inflação e a redução da base monetária não tem sido suficiente para estabelecer o controlo da subida dos preços em limites compagináveis com as condições de vida da população e de atractividade do investimento privado. As importações, enquanto complemento da oferta total, não têm o mesmo espaço de afirmação de outrora, devido às limitações tarifárias e à política de substituição das importações. De resto, ainda estão por calcular os efeitos da aplicação da pauta aduaneira sobre o aumento real da produção interna, em condições competitivas: qual o impacto de 1% de incremento da pauta aduaneira sobre a variação da produção interna? O que é que fica mais barato à economia? Reduzir as importações pela via da desvalorização cambial ou impondo reservas tarifárias e não tarifárias à sua entrada no país (ver gráfico).
Sabe-se que o manejo da política monetária requer conhecimentos teóricos sobre um ramo da Ciência Económica que é manifestamente muito complexo, sobretudo quando se trata de conciliar estabilidade dos preços com o crescimento económico, que precisa de massa monetária em circulação no sistema económico real e no sistema bancário.
Ainda que cometa um erro de apreciação, por falta de informação, creio que a inflação não está, por enquanto, totalmente estudada e compreendida no nosso País (não sei se o BNA continua a elaborar e a publicar um relatório sobre a inflação, que era de natureza semestral). Considero cinco aspectos importantes a pesquisar, para que se tenha uma compreensão profunda do fenómeno e das vias para o estabilizar em limites competitivos (ainda que não pareça, a inflação pode estimular o crescimento da produção): a inércia dos preços, os custos de produção, a variação dos salários, o comportamento da produtividade e as antecipações dos agentes económicos.
Alves da Rocha escreve quinzenalmente