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Angola

Discurso "macio" de directora do FMI e aproveitamento político geram mal-estar

DEMASIADA DIPLOMACIA EM TEMPOS DE CRISE, DIZEM ACADÉMICOS ANGOLANOS

Visita com ambiente demasiado controlado e de recorrente elogio ao Governo está a ser alvo de críticas, já que ocorreu numa altura em que há um novo descontrolo orçamental, com défices elevados no horizonte. Mas, depois do "doce", o "amargo de boca" deverá vir com a visita do artigo IV que arranca para a semana.

A visita da directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI) a Angola foi marcada por um ambiente controlado e um discurso "macio" e de elogio recorrente ao Governo, escusando- -se a "colocar o dedo na ferida", o que contrasta, na opinião de vários académicos e economistas, com o ambiente que se vive no País, em que o próprio Executivo aponta a défices orçamentais elevados em 2025 e em 2026, o que compromete, até, aquilo que foram os objectivos do último programa da instituição multilateral em Angola.

O discurso "macio" de Kristalina Georgieva e o aproveitamento dos órgãos públicos em passar uma imagem de que "está tudo bem" acabam por enfraquecer a instituição, admitem académicos angolanos.

"FMI: Angola conseguiu virar a página de um crescimento económico negativo para positivo", "FMI felicita Angola pelas reformas económicas implementadas desde 2017", "Directora do FMI reafirma apoio às reformas em curso", "FMI realça progressos de Angola na recuperação da estabilidade macroeconómica" e "FMI elogia reformas económicas em Angola" foram alguns dos títulos publicados em órgãos de comunicação social públicos que, no fundo, são representativos do rol de elogios que a directora-geral da instituição decidiu presentear o Governo.

Este aproveitamento político da visita da responsável máxima do FMI também pode ser encontrado num vídeo que o Ministério das Finanças publicou no Facebook, onde, entre reuniões de trabalho, também constam vários momentos de confraternização e "abraços" da equipa económica com os responsáveis do FMI.

Ainda que sejam descontados os exageros característicos destes órgãos de comunicação, o discurso que a responsável máxima da instituição multilateral trouxe ao País, naquilo que o FMI caracteriza de "visita de cortesia", está a ser bastante criticado nos meios académicos junto dos especialistas do sector da economia.

Isto porque, além dos elogios às reformas e de dar quase como recado único a necessidade de continuar com a reforma aos subsídios aos combustíveis, Kristalina Georgieva não fez qualquer referência a questões de mais curto prazo, como as debilidades orçamentais do país e os défices que o Governo aponta para 2025 e 2026, equivalentes a 3,3% do PIB (3,9 biliões Kz) e 2,8% (3,8 biliões Kz) que, no fundo, comprometem o programa que o Fundo desenvolveu no País entre 2019 e 2021, que visava a correcção de desequilíbrios económicos estruturais.

Um professor universitário e economista adiantou ao Expansão que achou de mau tom a postura de elogio por parte de Kristalina Georgieva, embora o compreenda, já que essa tem sido a postura habitual do FMI, numa lógica diplomática da instituição.

Já o também economista e director do Centro de Estudos da Universidade Lusíada (Cinvestec), Heitor Carvalho, admite não ter ficado surpreendido, já que o "elogio é também parte da diplomacia do FMI que sabe que tem de trabalhar com os Governos e, portanto, tem de os conquistar para poder influenciar".

Ainda assim, admite alguns exageros nos elogios ao que tem sido feito no País. "Acho que o maior elogio foi para o combate à corrupção que, convenhamos, para quem não conhece os pormenores das relações imita bem: os filhos do ex-presidente do mesmo partido na cadeia, o genro do primeiro Presidente na cadeia, etc. É só isso que ela vê ao longe e parece-lhe bem", sublinha Heitor Carvalho.

Por outro lado, o economista e gestor Álvaro Mendonça desvaloriza a questão, por entender que no âmbito de uma visita oficial, com as cortesias e os cuidados diplomáticos que este tipo de deslocação pressupõe, "não faria qualquer sentido que Kristalina Gerorgieva fizesse qualquer crítica pública à condução económica do Governo".

E acrescentou: "esta vinda da directora-geral do FMI foi, naturalmente, mais uma ocasião para reforçar a imagem de grande estadista que a comunicação do Governo quer colar ao Presidente João Lourenço. E a verdade é que o também Presidente da União Africana se tem multiplicado em contactos internacionais e na organização de importantes eventos em Luanda, que lhe dão o direito a reclamar esse estatuto".

Porém, dentro de portas - diga- -se reuniões com o Governo - as coisas poderão ter-se passado de forma diferente, admite. Até porque a posição do FMI sobre a conjuntura económica de Angola é conhecida, e não é propriamente positiva. "Tudo somado, a verdade é que se a avaliação do FMI sobre a economia angolana se transmitisse em sorrisos, então talvez a responsável máxima do FMI tivesse passado por Luanda com um ar mais sorumbático", admite Álvaro Mendonça.

Além de encontros com o Presidente da República e com a equipa económica do Governo, a directora do FMI participou num encontro com estudantes e professores na Universidade Católica de Angola, no qual destacou que os jovens são o maior património do País.

Leia o artigo integral na edição 854 do Expansão, sexta-feira, dia 28 de Novembro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

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