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Angola

Divórcios podem custar entre 40 mil e vários milhões de kwanzas

O NÚMERO DUPLICOU EM DOIS ANOS

A lei n.º 5-A/21 de 5 de Março, que alterou o valor dos custos das acções de divórcio para mais de 6 milhões Kz, tem sido mal interpretada. Ou seja, esse valor é visto por muitas pessoas como o montante a pagar por todo o processo de divórcio, o que não é verdade, diz especialista em direito civil. Se for de mútuo acordo, numa conservatória, o divórcio custa apenas 40.238 Kz.

No dia 26 de Abril de 2021 a Lei nº5-A/21 de 5 de Março alterou o valor das custas judiciais e alçadas dos tribunais nos casos de divórcio para mais de seis milhões Kz, o que levou grande parte da população a interpretar que esse passaria a ser o valor que qualquer pessoa passaria a pagar se se quisesse divorciar, o que não é verdade.

A advogada Stelvia Costa explicou ao Expansão que este valor é o da alçada e serve apenas como um dos critérios para determinar a competência de um tribunal para julgar certos processos, a forma do processo e a admissibilidade de recurso ordinário, como foi referido acima.

Ou seja, a Lei n.º 5-A/21, de 5 de Março fixou o valor da alçada do tribunal da relação (tribunal de recurso por excelência) em 6 160 000 Kz e a dos tribunais de Comarca (tribunal de primeira instância) em 3 080 000 KZ. Este valor da alçada está relacionado com os valores que estão agregados ao processo e requerem decisão do tribunal em caso de litígio, e não com os custos da tramitação (emolumentos) do divórcio.

"Quando o valor da acção, que é o benefício económico que a pessoa que dá entrada do pedido em tribunal retira da acção, ou seja, o benefício imediato do pedido do autor esteja acima dos valores indicados, os mencionados tribunais não possuem competência para julgar tais acções, sendo a competência, nestes casos, do tribunal imediatamente superior. No caso do Tribunal da Relação, por exemplo, será competente o Tribunal Supremo", explica-nos.

Segundo um conservador que falava ao Expansão nesta quarta-feira, a má interpretação desta lei fez com que muitos casais adiassem a decisão do divórcio, mesmo já estando separados, por terem entendido que o processo custaria os seis milhões Kz. "Muitas pessoas, algum tempo depois da publicação da lei, procuraram a conservatória para saber se o custo do divórcio era mesmo de seis milhões ou não, e depois de terem sidos esclarecidos deram entrada do processo. Acredito que se não fosse a interpretação equivocada da lei nº5-A/21 os números dos divórcios seriam muitos superiores aos actuais".

Apenas 40 mil Kz

Nos casos do processo de divórcio por mútuo acordo e que seja tratado junto de uma conservatória do registo civil, o conhecido divórcio administrativo, tem o valor de 36.500 Kz, acrescido do valor de 3 928 Kz pela passagem da certidão do referido processo, o que perfaz um valor total de 40 328 Kz. Este é o valor mais baixo que se poder pagar em caso de divórcio.

Já o processo de divórcio junto do tribunal está sujeito ao pagamento de custas judiciais, designados preparos, num total de 214.500 Kz, sendo 49.500 Kz como preparo inicial, 66.000 Kz a título de preparo subsequente, 49 500 Kz como preparo do julgamento e 49 500 Kz da decisão.

Os valores de um divórcio ficam muito mais altos quando as divergências obrigam à presença de advogados, especialmente se não se consegue atingir um ponto de entendimento e tornam-se em processos litigiosos. Neste caso, entre custas a pagar, honorários de advogados e outras prestações financeiras ou património a entregar ao cônjuge, o valor global pode ascender às dezenas de milhões de kwanzas.

Ainda assim, e segundo os dados da Direcção Nacional de Identificação, Registo e Notariado, entre Janeiro de 2020 e o primeiro trimestre de 2022, foram registados 175 divórcios em todo o País, números que duplicaram face ao período homólogo, sendo que a maior foi em Luanda, que lidera com 81% dos divórcios registados, num universo de mais de 26 mil casamentos.

Durante o período em referência destes 175, além de Luanda com 142, foram também registados divórcios em Benguela (16), Huíla (11), Cunene (3), Cuanza Sul (2) e Malanje (1). Curiosamente, em 12 províncias de Angola não há para este período registo de divórcios.

"Os angolanos não tinham muita cultura de se divorciar. Alguns apenas se separavam e não levavam o processo em tribunal porque não queriam voltar a casar, mas agora já tem sido diferente. Nesses dois últimos anos os números dos divórcios mais que duplicaram em relação aos números que tínhamos anteriormente" disse ao Expansão uma fonte do Direcção Nacional de Identificação, Registo e Notariado.

Continuar a casar

"Continuo a aconselhar as pessoas a casarem apesar de me estar a divorciar. Quem quer casar, que case. Depois, caso haja divórcio, tem de arcar com as consequências." Essas foram as primeiras palavas Manuela Félix de 45 anos, empresária que tem neste momento um processo de divórcio em tribunal. Foi casada durante 15 anos e é mãe de 6 filhos. Quando casou o seu companheiro já tinha 7 filhos que passaram a viver com ela depois do casamento. Hoje Manuela vê no divórcio a solução para continuar a sua vida de forma tranquila.

"Tem sido muito difícil, principalmente para as crianças. Isso porque o divórcio é litigioso, porque eu assim o quis. Já conversei com os meus advogados e essa é a melhor forma de eu sair deste processo. Não quero mútuo acordo porque foi ele que deixou a casa e os filhos. Se eu pudesse deixava-o sem nada porque foram muitos anos a aguentar as traições. Estamos a negociar e não estou disposta a sair com pouca coisa desta relação", confirmou.

Já Cátia Ngola, que foi casada durante três anos, também tem um processo em tribunal e diz que só quer se ver livre do processo para continuar a vida.

"Quero começar de novo, fazer tudo de forma diferente agora. Já esperei de mais. Não entendo porque que estes processos duram tanto tempo. Só quero descansar e esquecer que um dia fui casada. O meu processo é aquele chamado de administrativo (que pode ocorrer junto de uma conservatória do registo civil) e custa apenas 40.328 Kz. Já fizemos tudo só estamos a espera que nos chamem para finalizar o processo" confirmou.

Um outro caso ouvido pelo Expansão é o de Andreia Patrícia. Disse-nos que adiou durante vários anos o divórcio, primeiro porque acreditava que ainda haveria alguma solução, depois por causa dos filhos, pensando que a manutenção da relação era o melhor para as crianças.

"Adiei por várias vezes por causa dos meus filhos, mas, quanto mais adiava, mais eu morria por dentro. Durante o processo do divórcio, muitas vezes senti-me sozinha, pois, em casa, tinha de ser forte pelos meus filhos, por mais que eu soubesse que poderia contar com eles. Gastei até 2,5 milhões Kz com o pagamento dos emolumentos e com o advogado porque com eu não concordei com a primeira decisão que foi tomada em tribunal e recorri", explicou.