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Opinião

Algumas perguntas para 2021

Laboratório Económico

"Ele já tinha visto os homens. E aqueles não eram diferentes dos que conhecera antes. Começamos por pensar que são heróis. Em seguida aceitamos que são patriotas. Mais tarde, que são homens de negócios. Por fim, que não passam de ladrões". Mia Couto em "Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra".

Bendita pandemia que nos concede tempo para se ler, reler, reflectir e aprender (aprender sempre é um valor dos humildes). Vem esta citação a propósito das recentes denúncias e acusações sobre quem foi quem nos processos de emigração de fundos públicos dos cofres do Estado para os bolsos de alguns dos cidadãos, alguns dos quais se chegou a pensar tratar-se de heróis ou patriotas ou homens de negócios, para, no final do dia, não passarem de acumuladores primitivos de capital e dinheiro pertença da Nação (não do Estado). Embora já descoberta a vacina contra a pandemia que dizimou milhões de pessoas e colocou as economias em estado de alerta e de emergência económica e social, as incertezas continuam a dominar os cenários de recuperação, discutindo-se ainda o modelo de saída. A pandemia, conforme vários estudos o confirmam, acelerou as desigualdades sociais em todo o mundo e nos países em desenvolvimento, entre as suas populações.

Naturalmente que a redução das disparidades internas na distribuição do rendimento nacional tem uma componente forte de política social nacional (é suficiente estudar as experiências dos países desenvolvidos e de alguns emergentes sobre como fortalecer o consumo e o rendimento das classes mais desfavorecidas), mas a contracção das trocas comerciais na economia-mundo foi também, crê-se, um factor de incremento das desigualdades.

Mesmo que 2021 possa trazer raios de esperança sobre a recuperação das dinâmicas de crescimento, se a pandemia passar mesmo e as economias voltarem a funcionar, isso será ainda de modo muito frágil, o que atrasará a sustentabilidade. Um problema de investimento, que se reduziu em 2020 (investir para produzir para quem?), esperando-se o mesmo para 2021. A União Europeia projecta uma queda no stock de capital fixo dos países que a compõem, ficando em 2024 ao nível do que foi antes da crise financeira de 2008. Significa que a capacidade produtiva se vai perdendo, receando-se, não havendo investimento significativo, que o saldo líquido (investimento novo menos amortizações) passe a ser negativo. O investimento, como nunca antes aconteceu, passa a ser o factor decisivo da recuperação económica em todos os países no pós-pandemia, sendo por isso que os Bancos Centrais aplicam o que se convencionou chamar de "bazuca financeira" de apoio ao sector privado (empresas e famílias (células básicas da criação de emprego e do consumo final)). Bastante destas ajudas em dinheiro são a fundo perdido, sendo o remanescente a título de cedências creditícias, em condições de juros baixos. Ainda assim, as principais instituições financeiras e económicas internacionais acautelam-se quanto aos impactos imediatos destas medidas, projectando-os para daqui a dois ou três anos (devido aos "lags" associados às aplicações de capital e dependentes do tipo de investimento e do sector onde se aplica).

Esta crise sanitária está a mostrar claramente a importância de haver, em todos os países, redes de segurança social para salvaguardar vidas e garantir a sobrevivência da população. Não obstante a sua existência na maior parte das economias avançadas, muitas delas falharam: o desemprego aumentou, os salários reduziram-se, os subsídios encurtaram-se, as infecções ampliaram-se, as mortes aconteceram e as fraquezas dos tecidos económicos revelaram-se. São conhecidas as debilidades dos sistemas de saúde e previdência em África, sendo por isso que se teme que os efeitos da Covid-19 acabem sendo mais devastadores, atrasando a recuperação.

Cinco anos de recessão e crise e um de crescimento pífio levam-me a reflectir 2021 em três domínios: condições de vida, emprego e crescimento económico, naturalmente com base em informações referentes a 2020, a maior parte ainda não disponibilizadas, em especial as Contas Nacionais do III trimestre de 2020(4) para se ter a verdadeira dimensão da queda do PIB e dos rendimentos e do nível de vida.

(Leia o artigo integral na edição 606 do Expansão, de sexta-feira, dia 8 de Janeiro de 2021, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)