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"Acho que é muito importante haver galerias, pessoas que se dedicam a esse trabalho"

MÁRIO TENDINHA

Mário Tendinha tem a exposição individual "Nós, os outros" na galeria Sky Gallery até 25 Junho. O artista plástico considera que as pessoas precisam de aprender a fazer bem as coisas e não servirem- -se apenas das influências de pessoas conhecidas.

O que quer dizer com o título da nova mostra "Nós, os outros"?

"Nós, os outros" surge dada a maneira como eu entendo e me posiciono neste mercado de arte que há em Angola, que é um mercado pequeno, emergente, onde há muita confusão.

Como assim?

Primeiro não há uma crítica da arte em Angola, não há críticos de arte em Angola. Não podemos considerar que, havendo um ou dois, que há crítica. Não há. Não há uma crítica habilitada e consequente, não há. E isto é mau para os artistas, porque hoje aquilo que estamos a chamar de artistas emergentes onde há, sem dúvida, jovens como muito talento e muita qualidade, mas no seio desta camada eles não se criticam.

Está sempre tudo bem. Isso é mau?

Corre-se o risco e é mau e perigoso, e eu chamo a isto o "perigosismo" do contexto. O que interessa neste momento é o contexto, é aparecer. É ser convidado para fazer uma palestra e ser conhecido de quem é amigo de A, B e C. Mas não significa que esta pessoa tenha talento, não significado que esta pessoa seja um bom pintor.

É apenas um jogo de influências?

Aqui em Angola, se não tens padrinho na cozinha não avanças. Isto acontece muito: o fulano de tal convida o outro fulano e depois diz "aquilo é que é"! Mas ele não o é, teve a sorte, os contactos e sabe se mexer, se insinuar. Quem sabe vender o seu peixe evolui. O outro, que é muito mais talentoso, mas é mais humilde e faz apenas o seu trabalho com verdade tem muito mais dificuldade em se mostrar. Eu faço parte de "Nós, os outros". Daqueles que não têm acesso a A, B, C ou D. É apenas para chamar a atenção sobre isto.

Considera o mercado de arte angolana ainda pequeno. Como fomentar a produção artística?

Acho que é muito importante haver galerias, pessoas que se dedicam a esse trabalho. Hoje não há muita gente a fazer este trabalho e não há muitas galerias. Qualquer galeria nova que apareça é uma bênção para os artistas, sem dúvida nenhuma. Houve uma altura em que, em Luanda, havia duas ou três galerias. Hoje há muito mais galerias e pessoas que trabalham na divulgação da arte. O que é muito importante.

Além das galerias, há a opção dos espaços comerciais que têm abertura para promover actividades artísticas.

É um risco para o artista por ser um centro comercial. É evidente que para um artista ter um centro comercial para expor é muito bom. Lembro que na altura da independência havia artistas, alguns com grande qualidade, mas não tinham onde expor.

Onde iam?

No Hotel Presidente, durante muitos anos. Muitos deles vindos da escola de Kinshasa e que desapareceram porque caíram no que já disse: este é o meu nicho de mercado. Escavaram de tal maneira, vendiam aquilo como quem está a vender jinguba ou tremoços mas faziam coisas fantásticas.

Onde é que eles andam? Nunca mais os viu?

Não. Diluiram-se. Se calhar, podiam ter um atelier, eu também faço isso, que é convidar pessoas para virem ao nosso espaço de trabalho. O António Gonga, que também faz parte de "nós, os outros" mas é uma excelente pessoa, humilde, belíssimo artista e os jovens vão para lá aprender e aperfeiçoar. O Mawete faz a mesma coisa até com artistas que já têm nome na praça.

Uma formação on job?

Além das escolas de formação artística. Eu costumo dizer sempre isto: há a ilusão de muitos jovens que frequentam as aulas de artes plásticas, como a pintura, desenho e outros, que aquilo é apenas conhecimento. Não significa que saem de lá artistas. Uma coisa é ter conhecimento, outra coisa é ter talento.

(Leia o artigo integral na edição 677 do Expansão, de sexta-feira, dia 03 de Junho de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)