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Grande Entrevista

"O futuro do trabalho e dos trabalhadores em Angola deixa-nos muitas reservas"

Manuel Viage secretário Geral da UNTA-CS

O Secretário-geral da União Nacional dos Trabalhadores Angolanos-Confederação Sindical, defende uma revisão à Lei Geral do Trabalho para reduzir o desemprego e a melhoria do sistema de protecção social obrigatório para o bem-estar dos trabalhadores.

Acompanha de perto a situação dos trabalhadores. Quais são os sectores que mais empregos têm perdido nesta fase?

Na primeira linha temos o sector da construção civil e obras públicas. O Governo era a entidade com mais empreitadas e, devido à falta de recursos, reduziu as suas obras. Isso afectou um grande número de trabalhadores que foram para o desemprego. Depois temos o sector da actividade comercial, que afectou muito as micro, pequenas e médias empresas. O terceiro segmento é o sector ligado aos serviços, de uma maneira geral, e aqui incluímos também os serviços de transporte.

Tem números de quantas pessoas já perderam o emprego nesta altura da Covid-19?

Dados oficiais, mas muito oficiais mesmo, falam em cerca de 4 mil concretizados e mais dois mil em perspectiva, segundo a ministra da Administração Pública Trabalho e Segurança Social. Nós não podemos falar em números concretos, mas informações que nos chegam, o número é substancialmente maior do que o Governo tem estado a apresentar. Estamos a falar em cerca de 30 mil pessoas já desempregadas este ano.

Isso inclui os contratos suspensos?

Os contratos suspensos não podemos considerar como perda de emprego. Porque o que acontece aí é apenas uma suspensão que o legislador diz que pode ter uma duração de seis meses. Findo o qual, se o empregador não tiver capacidade de retomar ou voltar a por activos os empregos, tem que percorrer o processo legal de despedimento que passa pela indemnização e outras coisas.

Esta suspensão é prevista por lei. Como é que olha para a Lei Geral de Trabalho?

O processo de discussão e aprovação desta lei não foi consensual. Há matérias estruturantes da Lei 7/15, Lei Geral do Trabalho, que penalizam os trabalhadores. Estou a falar de questões relacionadas com as formas de celebração dos contratos, remuneração... Sobretudo nas situações em que estamos diante de indemnizações ou compensações e na forma de abordagem da protecção social dos trabalhadores, que por razões de doença precisam de ser protegidos.

Os trabalhadores estão desprotegidos?

A protecção não está suficientemente nos termos da lei, tendo em conta que o órgão competente do Estado, o Instituo Nacional de Segurança Social (INSS), chamado a prestar assistência a essas pessoas não o faz, alegando falta de condições. Consideramos que a actual lei geral do trabalho é discriminatória.

Porquê?

Porque o comum é o factor trabalho olhar para as competências, para a valência profissional dos trabalhadores. E não condicionar a remuneração, valorização das competências de um dado trabalhador, à dimensão da empresa onde ele presta trabalho. É aí onde consideramos que o factor trabalho é abordado de forma discriminatória. E pela forma como os contratos de trabalho são abordados consideramos que esta lei ao invés de defender e proteger a estabilidade do emprego, cria instabilidade.

Em que sentido?

Porque ao valorizar o contrato de trabalho por tempo determinado em detrimento do contrato por tempo indeterminado, mesmo para postos de trabalho permanente, retirou esta perspectiva de segurança de quem presta trabalho. Hoje estamos diante de empregadores que para os postos de trabalho permanentes estão a celebrar contratos com duração de até 90 dias com períodos renováveis pelo mesmo tempo.

Isto não promove a competitividade?

Com contratos de trabalho com períodos tão curtos, 90 ou 180 dias, quando é que o trabalhador vai ser efectivo de determinada empresa! As organizações sindicais estão a trabalhar para apresentarem nos próximos dias ao Presidente da República e outros órgãos que concorrem para o exercício da actividade laboral, um relatório para interpelar estas instâncias no sentido da revisão da Lei Geral do Trabalho.

Defendem a revisão da lei geral do trabalho?

Sim. Há matérias que nos deixam muitos preocupados como, por exemplo, a forma de celebração de contratos, a forma discriminatória que a lei estabelece na abordagem das valências profissionais, o pagamento das indemnizações e outras que justificam que a lei seja revista. Porque a continuar assim, este clima de instabilidade vai permanecer.

(Leia a entrevista integral na edição 586 do Expansão, de sexta-feira, dia 7 de Agosto de 2020, em papel ou versão digital com pagamento em Kwanzas. Saiba mais aqui)