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Opinião

Salário mínimo nacional e a sua influência na melhoria da distribuição do rendimento

Laboratório Económico

As desigualdades sociais continuam a dominar a realidade nacional, em diversas vertentes. Creio que, à medida que o tempo for passando, tornar-se-á cada vez mais difícil garantir um estatuto de igualdade de oportunidades e de convergência de níveis de vida a todos os cidadãos, tal como consagra a Constituição.

Cada vez que me desloco às várias periferias da cidade de Luanda constato condições de vida degradantes, sendo o mais frustrante a aparente falta de esperança de as reverter no curto prazo. Os contrastes com as várias cidades-condomínios do asfalto são, na verdade, gritantes, levando a pensar que os angolanos só perante a Lei são iguais.

Muitos estudos internacionais sérios e confiáveis têm constatado que a globalização/ mundialização foi, de facto, um factor que permitiu reduzir as desigualdades entre os países. A China, a Índia, o Brasil, uma parte significativa de África (com destaque para a África subsariana) são hoje espaços económicos com uma participação relativamente importante no comércio mundial, no PIB global e na geo-estratégia das nações. A China, em 30 anos, tornou-se na segunda potência económica e o Brasil caminha para tirar a liderança às "velhas" economias industriais da Europa. Tudo isto teve uma influência indelével da globalização e da abertura das economias.

Quando as economias atravessam fases de crescimento do PIB e de quase-pleno emprego, o agravamento das desigualdades - que, normalmente, ocorre em proporções relevantes, embora disfarçáveis pelo conhecido efeito de contágio - acaba por ser mais ou menos aceitável (é isto o que tem acontecido no nosso País que possa explicar o relativo apaziguamento social?), não sucedendo o mesmo em situações de crise económica e de desemprego elevado.

Em Angola, os índices de desigualdade são, também, elevados: 20% da população concentra 60% do rendimento nacional (não há estatísticas sobre a riqueza, mas seguramente que neste item as desigualdades são manifestamente muito mais significativas) e cerca de 2/3 da população tem menos de 2 USD por dia para viver (?). A norma fundamental para a reflexão em torno do estabelecimento de um salário mínimo nacional é a de que o trabalho é a única fonte de riqueza, rendimento, desenvolvimento e progresso. Quase tudo numa economia se pode (deve?) reduzir ao trabalho. Já Marx argumentava que o próprio capital mais não é do que trabalho cristalizado. Sem trabalho nada mais pode ser exigido. Os aspectos económicos acabam por ser sempre os determinantes em última instância dos domínios sociais. Se uma economia não funcionar do ponto de vista da produção e da produtividade nada mais pode ser estabelecido, como regra, como princípio ou como intenção.

Ineficiência económica

O que é mais importante neste momento para a sociedade angolana, os trabalhadores, os empresários e os decisores públicos: o desemprego ou o trabalho com um salário mínimo? O que é que tem mais peso em termos económicos? O desemprego traduz ineficiência económica, não garantia do direito ao trabalho, nem dos direitos do trabalho, desutilidade social de um recurso relativamente abundante. O trabalho com salário mínimo corresponde a viver-se pobre e sem rendimento seguro. Se a tónica da política económica (em particular da de emprego) for dada ao combate ao desemprego, a rigidez do mercado de trabalho pode ser um óbice importante para essa finalidade. Pelo contrário, se for a situação dos actuais trabalhadores que conta e a sua defesa se entender passar pelo estabelecimento de um salário mínimo obrigatório, então o desemprego prevalecerá, podendo mesmo ocorrer destruição de postos de trabalho e inflação pela via dos custos empresariais.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), reconhecendo que nas condições actuais os salários mínimos continuam a ser um tema de debate na agenda política de todos os países, incentiva todos os países-membros a adoptar a norma do salário mínimo para se reduzir o número de trabalhadores pobres e proporcionar a protecção social dos trabalhadores vulneráveis (1).

A norma fundamental para a reflexão em torno do estabelecimento de um salário mínimo nacional é a de que o trabalho é a única fonte de riqueza, rendimento, desenvolvimento e progresso. Quase tudo numa economia se pode (deve?) reduzir ao trabalho. Já Marx argumentava que o próprio capital mais não é do que trabalho cristalizado. Sem trabalho nada mais pode ser exigido. Os aspectos económicos acabam por ser sempre os determinantes em última instância dos domínios sociais. Se uma economia não funcionar do ponto de vista da produção e da produtividade, nada mais pode ser estabelecido, como regra, como princípio ou como intenção.

Ganhos de produtividade

Valem estas considerações para dizer que a variável determinante para o estabelecimento do salário mínimo tem de ser a produtividade e o seu comportamento ao longo do tempo, isto é, os ganhos de produtividade (2).

Determinar por lei a prática de um salário mínimo, sem exigir em contrapartida o cumprimento de uma norma básica de produtividade, corresponde à assunção de vários riscos: o primeiro, no âmbito da inflação: aumentar a massa de salários (porque é disso que se trata ao estabelecer-se um valor fixo para o salário mínimo) para um mesmo volume de trabalhadores é potenciar o incremento nominal da procura (consumo privado) para uma mesma oferta; o segundo, poder-se-á traduzir na consideração do salário mínimo como uma espécie de bónus social ou de um "direito de humanidade", a que todos os trabalhadores terão acesso só pelo simples facto de o serem ou de o parecerem; o terceiro, no âmbito do emprego: sempre que o salário mínimo estabelecido por lei suplantar a produtividade marginal esperada do emprego de mais uma unidade de trabalho, os agentes económicos preferirão não investir, não aumentar a produção ou explorar mais intensamente a quantidade de factores de produção existente; o quarto, é observável no domínio dos custos de produção: aceitar o cumprimento de uma referência salarial mínima corresponde, directamente, a um aumento dos custos unitários de produção e a uma repercussão imediata sobre os preços de venda (inflação pelos custos de produção).

Para valores baixos da produtividade do trabalho - como é manifestamente o caso da economia não petrolífera nacional -, o salário mínimo acaba por corresponder, na prática, a um subsídio que a sociedade atribui aos trabalhadores por razões de solidariedade (quase um rendimento mínimo garantido), mas que tem um custo social traduzido no custo de oportunidade de outras aplicações deste montante em numerário e um "custo de dignidade" veiculado pela dependência que cria e pelo seu carácter assistencial; mas tem também um custo económico espelhado em receitas que se deixa de realizar.

O salário mínimo é bom para quem já se encontra no mercado de trabalho, mas mau para quem procura emprego. No primeiro caso, é uma garantia de um rendimento mínimo para adquirir uma cesta básica de produtos, podendo, no entanto, não haver garantia de que o montante estabelecido por lei seja sempre respeitado. No segundo caso, é mau para os excluídos do mercado de trabalho porque funciona como um entrave à criação de novos postos de trabalho, porque a sua imposição tem como contrapartida directa o aumento dos custos empresariais, levando as empresas a utilizar mais eficientemente os recursos existentes.


(1) Um fenómeno recente é o aumento da taxa de pobreza entre trabalhadores, questionando-se, portanto, se o aumento do emprego é condição suficiente para a sua redução e colocando-se, de modo muito mais enfático, a importância dos níveis salariais dos trabalhadores. (2) A OIT define os critérios seguintes para enquadramento do valor do salário mínimo: necessidades dos trabalhadores e das suas famílias, índices de produtividade do trabalho e necessidade de se manter um nível elevado de emprego.