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Gestão

Empresas com alma: quando o propósito se torna vantagem competitiva

EM ANÁLISE

A obsessão por metas financeiras pode produzir resultados imediatos, mas esgota equipas, fragiliza culturas e torna as empresas vulneráveis a crises reputacionais. Quando não há um propósito partilhado, cada colaborador opera como uma célula isolada. O todo perde coesão. A cultura degrada-se silenciosamente. E, com o tempo, o negócio perde aquilo que o tornava único.

Num mundo onde tudo parece cada vez mais rápido, volátil e competitivo, o que realmente sustenta uma empresa a longo prazo? Resultados trimestrais? Planos de expansão? Estratégias de marketing digital? Ou algo mais profundo e invisível - como a razão de ser da organização?

O conceito de propósito empresarial tem ganho destaque em fóruns de gestão, relatórios de ESG e estudos sobre inovação. Mas, na prática, ainda são poucas as empresas em Angola que se confrontam com esta pergunta essencial: para que existimos para além de gerar lucro?

É certo que o lucro é vital - é o oxigénio da empresa. Mas nenhuma organização respira apenas para continuar a respirar. O problema não está no lucro, mas na ausência de sentido que sustente as decisões nos momentos difíceis. E é precisamente nos contextos de instabilidade, como o angolano, que esta ausência se revela com maior força.

A obsessão por metas financeiras pode produzir resultados imediatos, mas esgota equipas, fragiliza culturas e torna as empresas vulneráveis a crises reputacionais. Quando não há um propósito partilhado, cada colaborador opera como uma célula isolada. O todo perde coesão. A cultura degrada-se silenciosamente. E, com o tempo, o negócio perde aquilo que o tornava único.

Na minha experiência como assessora organizacional em Angola, tenho acompanhado empresas que, apesar de resultados robustos, enfrentam problemas internos graves: rotatividade elevada, climas organizacionais tóxicos, falta de lealdade à visão estratégica. Em todos estes casos, a ausência de um propósito vivo - e não apenas escrito num quadro na recepção - é o denominador comum. Uma empresa com alma é aquela que conhece e vive o seu "porquê". Não se trata apenas de ter uma missão escrita com boas intenções. Trata-se de incorporar, nas decisões diárias, um compromisso com algo maior do que o lucro - seja o impacto social, a transformação de uma realidade local ou a defesa de valores humanos.

Como afirma o economista Amartya Sen, "o desenvolvimento deve ser visto como um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam". Isso aplica-se também às empresas: crescer não é apenas aumentar receitas, mas contribuir para ampliar oportunidades, dignidade e bem-estar nas comunidades onde actuam.

No Quénia, a engenheira Nzambi Matee fundou a Gjenge Makers, que transforma resíduos plásticos em tijolos mais fortes do que o cimento. A empresa gera lucro, reduz lixo e constrói escolas. Um exemplo de como a solução de problemas sociais pode ser também uma oportunidade de negócio.

Já a marca Patagónia, nos EUA, orienta toda a sua actividade pela preservação ambiental. Ao incentivar os clientes a repararem a roupa em vez de comprarem nova, aumentou as vendas e fidelizou uma geração inteira de consumidores conscientes. Em Angola, começam a surgir sinais. A TotalEnergies, através do projecto Kaminho, comprometeu- -se a eliminar o flaring (queima controlada de gases excedentes) e garantir milhões de horas de trabalho local. A Angola LNG tem investido em infraestruturas regionais e biodiversidade. Embora haja muito caminho a percorrer, é encorajador ver empresas de sectores tradicionalmente extractivos a reconhecer que o seu papel vai para além da exploração de recursos.

Embora seja animador ver iniciativas de empresas como a TotalEnergies ou a Angola LNG, é fundamental reconhecer que muito do investimento social corporativo ainda ocorre de forma fragmentada e pouco enraizada no propósito da organização. Em muitos casos, os projectos sociais coexistem com culturas internas desumanizantes ou modelos de liderança excessivamente hierárquicos. O verdadeiro desafio está em alinhar o que a empresa faz externamente com aquilo que ela é internamente.

Uma empresa com alma não se limita a patrocinar acções pontuais - ela vive, respira e inspira a mudança a partir de dentro. Essa coerência é o que gera confiança. E confiança, no contexto angolano, onde tantas instituições perderam a ligação com as comunidades que deveriam servir, é talvez o activo mais escasso e mais valioso que uma organização pode cultivar.

O crescente foco em ESG - Environmental, Social and Governance - reforça esta tendência global de reposicionar o papel das empresas no mundo. Já não basta gerar lucro; é preciso demonstrar responsabilidade ambiental, compromisso social e ética na governação. O ESG não é um selo para parecer "verde" ou socialmente correcto. É uma métrica de maturidade organizacional e um indicador de resiliência a longo prazo. Empresas com propósito genuíno encontram no ESG um aliado natural - pois alinham, de forma orgânica, as suas práticas ao impacto que querem deixar no mundo.

Leia o artigo integral na edição 835 do Expansão, de Sexta-feira, dia 18 de Julho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

ARIANA ORTET VIGELANDZOON, Coach, Terapeuta Holística e Assessora rganizacional

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