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Grande Entrevista

"Nós não recebemos instruções do Ministério das Finanças"

MARIA UINI BAPTISTA, PCA DA CMC

Maria Uini Baptista explica que ser tutelado não é ser subordinado, referindo que a CMC está a caminhar para ter um estatuto similar ao do BNA e ser uma entidade administrativa independente. E afirma que nunca sentiu pressão política.

Quem avalia o seu trabalho que critérios é que acha que utiliza? Será o número de processos de registo que recebe, chumba ou aprova, o volume de transacções, investidores e empresas e instituições a financiarem-se por via do mercado de capitais?

Antes de passar para os critérios de avaliação é interessante entender os quatro pilares de base do trabalho da Comissão do Mercado de Capitais (CMC). O primeiro é a regulação do mercado, o segundo a supervisão, seguem-se a promoção e fiscalização do mercado de capitais. Os objectivos estratégicos da CMC estão ligados a estes quatro pilares.

Qual tem sido a vossa actuação no âmbito destes quatros pilares?

Conhecendo esses quatro pilares é mais fácil entender os critérios. Por exemplo, a fiscalização do mercado resume-se à nossa posição de garantir que o mercado tenha o acompanhamento necessário. Que haja acções de supervisão para encontrar algumas insuficiências do mercado, que a regulação seja adequada ao estágio do mercado. Que o quadro regulatório seja robusto não só para o momento que se vive, mas para evolução futura.

E no âmbito dos outros pilares?

Em termos de promoção, estamos focados em desenvolver e apoiar todas as iniciativas tanto ligadas à literacia financeira como algumas iniciativas para o desenvolvimento do mercado. Todos esses pilares, cada um deles alinhado aos objectivos estratégicos da CMC, permitem avaliar o trabalho da Comissão do Mercado de Capitais, que não sou apenas eu, mas uma extensa equipa. Aqui o trabalho é colectivo, em equipa.

Tentando ser prático. O que é que mais a preocupa nestes quatro pilares, ou seja, quando fala em fiscalização, regulação, supervisão e promoção, o que de facto está em causa?

Vou começar pela promoção, porque sem promovermos o mercado não vamos ter supervisão e não conseguimos fiscalizar. A maior preocupação é termos o mercado accionista funcional. Ter um mercado profundo com liquidez, em que os actuantes estejam esclarecidos, e tenham também algum nível de sofisticação. Temos preocupação relativamente à participação de mais investidores institucionais, no caso, estamos a falar de seguradoras, fundos de pensões e outros.

Qual a maior preocupação neste momento em termos de promoção do mercado de capitais?

Queremos que as empresas utilizem o mercado de capitais, mais concretamente o mercado accionista para se financiarem. Eu penso que a maior preocupação a nível da promoção é ainda não termos o mercado accionista funcional.

Ou seja, é um critério que ainda não está preenchido?

É um segmento que ainda não está activo. Porque temos a indústria de fundos de investimento e outros a funcionar, mas em termos de preocupação neste momento, nós estamos focados para que o mercado de bolsa de acções realmente funcione e que sirva a economia, sirva os cidadãos, as famílias e as empresas.

E em termos de supervisão?

Podemos dizer que nós amadurecemos muito em termos de supervisão, mas ainda havia problemas, por exemplo o do modelo de dupla supervisão da banca. E isto responde já a uma questão que muito se fala a nível do mercado, que é os bancos agirem como agentes de intermediação e serem bancos, e terem a CMC e o BNA a supervisioná-los.

Porque a CMC e o BNA decidiram que os bancos vão manter-se como intermediários financeiros apenas até ao final deste ano?

Isso criava alguns problemas, não é o modelo ideal. Requeria mais trabalho por parte dos bancos, obrigava a um esforço adicional porque eles precisam de ser licenciados tanto no banco nacional como na CMC, e claramente isto vai ser resolvido com esta transição. Isto tem sido uma grande preocupação.

Mas há investidores a reclamar que os bancos não respeitavam os seus direitos de informação plasmados no Código de Valores Mobiliários?

Tínhamos uma preocupação de algum desconhecimento das normas e das regras do mercado. Primeiro dizia-se que o mercado ainda era incipiente e estava a começar, mas quando atingimos volumes de transacção num ano à volta de um bilião de kwanzas, nós já reconhecíamos que havia necessidade de reforçar as iniciativas de supervisão.

Mas estas transacções de mais de um bilião por ano são suportadas fundamentalmente pelo Estado com as emissões de títulos de dívida pública?

Sim, mas isso significa que temos investidores. Ou seja, temos poupança a ser canalizada para o mercado de capitais. A questão que trago como preocupação é como proteger os investidores que participam destas transacções de um bilião de Kz? Como é que as transacções estavam a ser feitas? Esta era a nossa maior preocupação e adequámos o nosso modelo de supervisão. Tivemos supervisões mais fortes que culminaram no ano passado em 78 processos sancionatórios e 53 multas no geral.

Quem foram as entidades mais sancionadas e multadas pela CMC o ano passado?

No geral falo das nossas entidades, falo das sociedades gestoras dos fundos e dos bancos. Posso dizer que maioritariamente foram os bancos.

Quais foram as principais infracções?

Posso destacar três grandes situações: a primeira é não acatar as instruções do regulador, a segunda é não seguir as regras de conflitos de interesses nas negociações, e depois tínhamos também a falta de reporte de informação que para nós é extremamente importante. Hoje observamos que temos menos processos sancionatórios, menos ocorrências. Temos um mercado bem mais atento e disciplinado.

(Leia o artigo integral na edição 671 do Expansão, de sexta-feira, dia 22 de Abril de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)