Só quatro em cada 10 famílias angolanas dizem que é possível poupar
Inquérito do INE sobre o II trimestre beneficiou do optimismo que a subida em 25% dos salários da função pública granjeou nas famílias. Mas a subida dos preços do gasóleo, dos transportes, da água e da luz permitem antever um autêntico "banho de água fria" no próximo relatório sobre o III trimestre.
Apesar do pessimismo em relação à situação financeira das famílias nos próximos 12 meses, 39,3% das famílias angolanas responderam positivamente à possibilidade de poupar algum dinheiro actualmente, de acordo com o Inquérito sobre a Conjuntura no Consumidor relativa ao II trimestre deste ano, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
Trata-se da maior percentagem em um trimestre desde os primeiros três meses de 2019, quando 37% respondeu "sim" à mesma pergunta colocada pelo INE. Numa altura em que a confiança das familias ainda estava muito influenciada pela subida em 25% dos salários da função pública em Fevereiro, e em que ainda não tinham aumentado os preços do gasóleo, bem como as tarifas dos transportes públicos e da água e da electricidade, apenas 3% das 3 mil famílias inquiridas afirmaram que não é possível poupar.
É perante este cenário, que deverá ser agravado agora no III trimestre face ao aumento dos preços verificados em Julho, que o Banco Nacional de Angola promove de 27 a 31 de Outubro a Semana da Poupança. Especialistas consultados pelo Expansão admitem que o pessimismo que resulta destes aumentos deverá fazer-se sentir quando responderem à questão "Com a situação económica do país, acha possível poupar algum dinheiro?".
Segundo Bernardo Vaz, investigador do Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada de Angola (CINVESTEC), o inquérito não reflecte a realidade das famílias angolanas, que gastam praticamente todo o seu rendimento em despesas essenciais, como alimentação, educação e saúde.
"A poupança é o que resta do nosso rendimento depois de efectuarmos as despesas correntes. Se o rendimento é baixo, depois do consumo não sobra nada. O rendimento de muitas famílias no país, neste momento, nem chega para cobrir o consumo", explicou.
A poupança, além de servir para financiar compras futuras das famílias, como imóveis e outros bens, indica também a capacidade da sociedade de financiar o crescimento económico, pois o montante poupado constitui uma das principais fontes de investimento para empresas e projectos, quando a poupança circula nas instituições financeiras. Ou seja, quando o dinheiro está nos bancos, há mais liquidez e, consequentemente, as taxas de juro baixam.
Essa liquidez permite conceder mais crédito, estimular o investimento e criar novos postos de trabalho. Mais empregos geram mais rendimento, o que, por sua vez, aumenta o consumo e expande o mercado. Na prática, quando as pessoas poupam, isso significa que estão mais confiantes e preparadas para enfrentar momentos difíceis ou crises e gerir riscos.
Em Angola, o índice de poupança das famílias (percentagem do rendimento aplicada em investimentos de renda fixa) não é conhecido devido à informalidade da economia e à baixa taxa de bancarização, actualmente à volta de 32%. Segundo o Banco Mundial (BM), no relatório económico Estimular o Crescimento com o Desenvolvimento do Sector Financeiro, as famílias angolanas apresentam níveis mais baixos de acesso ao crédito, à poupança e aos serviços financeiros digitais, quando comparadas com as famílias dos países da SADC.
Além do baixo nível de poupança, os mecanismos utilizados pelos angolanos para guardar o seu dinheiro também são considerados inadequados. "É importante distinguir poupança de entesouramento. Guardar dinheiro em casa não é poupar, é entesourar. Poupança é um conceito técnico: é o dinheiro que não está a ser gasto e que, ao mesmo tempo, gera rendimento", esclarece Bernardo Vaz.
Leia o artigo integral na edição 849 do Expansão, de sexta-feira, dia 24 de Outubro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)











