Infracções de branqueamento de capitais somam multas de 255 milhões Kz
As multas aplicadas pela ARSEG por falhas na prevenção do branqueamento de capitais já atingem 255 milhões Kz, revelando uma viragem clara na supervisão do sector segurador. Especialistas alertam que a nova postura do regulador marca o início de um ciclo de exigência real e não apenas documental.
Num ano em que Angola acelera a estratégia para sair da lista cinzenta do GAFI, o sector segurador tornou-se um dos focos centrais da supervisão prudencial e comportamental. A ARSEG, historicamente mais discreta no controlo das práticas de prevenção de branqueamento de capitais (BC) e financiamento do terrorismo (FT), mudou claramente de postura: em apenas seis meses aplicou 255 milhões Kz em coimas, um valor inédito no mercado segurador e que reflecte a convergência entre pressão internacional, reforço regulatório e necessidade de credibilização do sistema financeiro não bancário.
A primeira multa - 70 milhões Kz à BIC Seguros, em Junho - funcionou como sinal de arranque de uma nova abordagem. A infracção não foi pontual, tratava-se de falhas "graves" nos procedimentos de identificação e verificação de clientes, avaliações de risco inexistentes ou incompletas, fraca conservação de dados e ausência de formação interna consistente. Poucas semanas depois, a ARSEG sancionou a Sol Seguros em 100 milhões Kz, também por incumprimento ou cumprimento defeituoso das obrigações de diligência e identificação.
Mais recentemente, a Aliança Seguros foi multada em 85 milhões Kz, num caso emblemático pela multiplicidade de falhas - avaliações de risco omissas, dossiês de clientes incompletos, conservação ineficaz de documentação e fragilidade nos mecanismos de controlo interno. Este conjunto de três processos, totalizando 255 milhões Kz, é mais do que um dado estatístico, revela que o regulador entrou finalmente no ciclo de enforcement que o GAFI reclamava há anos.
A supervisão deixou de se limitar à existência formal de políticas e manuais - frequentemente "de fachada", como admitiu fonte da ARSEG - e passou a exigir eficácia real. As inspecções off-site e on-site revelaram que muitas seguradoras apresentavam instrumentos de compliance apenas para cumprir requisito documental, sem aplicação prática, sem testes de controlo e sem capacidade operacional. Para especialistas como Evaristo Dembe, técnico de compliance, esta mudança aconteceu porque a pressão internacional obrigou o regulador a agir.
A inclusão de Angola na lista cinzenta "foi um mal necessário", diz, porque expôs a fragilidade do sector segurador nesta matéria e precipitou a modernização regulatória: revisão da Norma 8/25, criação da Norma 3/25 sobre conduta de mercado, implementação dos guias de beneficiário efectivo e de PEPs. O leque de diplomas publicados em 2025 demonstra que o regulador passou a olhar o compliance como um pilar estrutural e não como um tema periférico. "Até aqui o regulador nem era visto como um actor decisivo na prevenção do branqueamento. Agora há um antes e um depois", disse, acrescentando: "O sector segurador nunca teve requisitos tão exigentes. Quem não se ajustar rapidamente vai ficar de fora".
Estar em compliance é crucial
A resposta das seguradoras não se fez esperar. A obrigatoriedade de fortalecer mecanismos de BC/FT está a gerar um movimento de transferência de quadros especializados do sector bancário - historicamente mais maduro e supervisionado - para o sector segurador. Sistemas informáticos, equipas dedicadas, procedimentos de due diligence reforçada e avaliações de risco segmentadas por produto estão a tornar-se investimentos estratégicos, não apenas custos de conformidade.
Como sublinha Jorge de Carvalho, "estar em compliance é crucial num sector que lida com poupanças, indemnizações e confiança pública". Mas a ARSEG também assume que parte desta transição dependeu da própria revisão normativa. Antes, aplicar multas elevadas podia colocar seguradoras pequenas em risco de solvência, levando o regulador a optar por acções correctivas mais brandas ou por adiamentos sucessivos.
Com o novo quadro legal, tornou-se possível sancionar de forma proporcional, mas ainda suficientemente severa para sinalizar risco reputacional e impacto financeiro. O objectivo é claro: mostrar que a tolerância zero deixou de ser retórica.
ARSEG aperta o cerco
Um fonte da ARSEG explicou ao Expansão que "no decorrer ou no cumprimento do plano de inspecções, fomos verificando que grande parte das seguradoras tinham políticas, tinham manuais, cumpriam alguns procedimentos, mas tudo de "fachada". Algumas, até de certa forma, estavam em compliance, mas a eficácia dos seus instrumentos era muito fraca e em muitas situações eram nulas. Então, para sinalizar ao mercado que o regulador está atento e que o regulador não iria tolerar esse tipo de situações, porque até é uma situação fundamental para o País, temos urgência que as instituições estejam em compliance nessas matérias, nós apertámos o cerco" Num cenário em que Angola precisa demonstrar ao GAFI resultados concretos - não apenas legislação aprovada, mas execução efectiva -, estas multas ganham dimensão estratégica. Elas são uma mensagem ao mercado, mas também ao exterior: o sector segurador já não é o elo fraco do sistema financeiro. A curto prazo, o endurecimento regulatório poderá pressionar custos operacionais das seguradoras mas a médio prazo, tende a elevar padrões, reduzir riscos de abuso e reforçar a credibilidade internacional de um mercado que movimenta milhares de milhões de kwanzas em prémios e indemnizações.
Leia o artigo integral na edição 856 do Expansão, sexta-feira, dia 12 de Dezembro de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)











