Um ano de nova Lei Geral do Trabalho: evolução ou revolução?
As leis do trabalho devem ser, por natureza, evolutivas: não podem ficar estanques e devem sempre ser analisadas, corrigidas e/ou melhoradas em função do estado do mercado do trabalho, economia e do contexto social. Resta saber se nos encaminhamos para a consolidação da nova lei ou se pendemos mais para uma nova reforma.
No próximo dia 26 de Março a Lei Geral do Trabalho aprovada pela Lei n.º 12/23, de 27 de Dezembro irá completar um ano de vigência. É por isso importante fazermos um balanço do impacto desta nova Lei no panorama jurídico angolano, as suas inovações e retrocessos.
A "nova" Lei Geral do Trabalho teve em vista melhorar as protecções dos trabalhadores, avançar alguns dos seus direitos sociais e alterar regras em matéria de contratação e cessação de trabalhadores por se ter concluído não serem adequadas para o mercado de trabalho nacional.
A "antiga" lei, aprovada pela Lei n.º 7/15, de 15 de Junho, era vista, simultaneamente, como demasiado progressiva e permissiva nalgumas matérias. A título de exemplo, na lei anterior, todas as regras fundamentais de contratação, remuneração e de consequências em casos de cessação ilícita estabeleciam diferentes padrões em função do tipo de empregador.
Mais concretamente, a lei anterior fazia recurso aos conceitos de Pequena, Micro, Média e Grande Empresa e estabelecia regras de contratação mais flexíveis ou custos laborais inferiores às empresas de menor dimensão, incorrendo as Grandes Empresas com a aplicação das regras mais exigentes ou custos laborais superiores.
Ora, a lei actual eliminou estes conceitos com base em argumentos de desigualdade entre agentes económicos, pelo que o que actualmente temos são regras idênticas para todo e qualquer tipo de empregador, seja qual for a sua dimensão, volume de negócios ou número de trabalhadores.
Este é um ponto polémico e de intenso debate pois se a nova lei veio, por um lado, uniformizar as regras para todos os empregadores, pequenos ou grandes, por outro, manteve parte da génese an iga de diferenciação dos agentes económicos quando, com o Decreto Presidencial n.º 152/24, de 27 de Julho, fixou os novos valores do salário mínimo nacional, definindo 50.000 Kwanzas como a remuneração mínima mensal para as Micro-Empresas e start-ups.
Assim, a opção legislativa e política tomada pela lei que agora celebra um ano de vigência é de difícil compreensão, visto que a mesma demonstra não ser mais que uma cortina aparente de inovação, não seguindo, na totalidade, o "novo panorama" que prometeu implementar.
Outro ponto de acesa discussão é o "novo" regime de contratação por tempo determinado, repescado da já longínqua Lei Geral do Trabalho de 2000.
A actual Lei Geral do Trabalho exige que os contratos por tempo determinado sejam celebrados com base num dos motivos justificativos listados na lei de forma taxativa, sendo que os prazos máximos variam agora entre 6, 12, 36 e 60 meses em função do motivo justificativo preciso que fundamenta a contratação. Este regime veio limitar os empregadores na contratação de trabalhadores, não fazendo face à substancial camada jovem activa angolana que procura trabalho.
Se por um lado procurou-se evitar formas de contratação vistas socialmente como precárias, como é o caso da contratação a termo, por outro foi colocada uma limitação relevante na flexibilidade de contratação. Será esta alteração legislativa um reflexo de progresso ou de retrocesso no mercado de trabalho nacional?
A alteração mais consensual patente na actual Lei é o reforçar dos direitos sociais dos trabalhadores, nomeadamente no que toca à implementação de um regime de horário flexível para trabalhadores com responsabilidades familiares e de uma licença de maternidade suplementar. Estas medidas impuseram deveres acrescidos aos empregadores, aos quais foi exigida uma adaptação às novas regras no que toca à gestão dos trabalhadores e da sua actividade. É ainda de relevo mencionar o dever de informação dos empregadores que esta alteração legislativa veio impor, nomeadamente no que toca às condições remuneratórias.
Em suma, apesar dos vários aspectos evolutivos de muitas das alterações que a nova lei trouxe, alguns dos pontos acima descritos provocaram efeitos discutíveis no mercado de trabalho nacional. Uma coisa é certa, as leis do trabalho devem ser, por natureza, evolutivas: elas não podem ficar estanques e devem sempre ser analisadas, corrigidas e/ou melhoradas em função do estado do mercado do trabalho, da economia e do contexto social do país. Assim, resta saber se nos encaminhamos para a consolidação da nova lei ou se pendemos mais para uma nova reforma. Apenas o futuro o dirá.
Leia o artigo integral na edição 826 do Expansão, de Sexta-feira, dia 16 de Maio de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)
**NUNO GOUVEIA, Sócio da Miranda & Associados, escritório membro da Miranda Alliance
ELIESER CORTE REAL, Sócio da Fátima Freitas & Associados, escritório membro da Miranda Alliance