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Gestão

Faz o que eu te digo e "chiu"

CAPITAL HUMANO

Enquanto a Lei não actualiza o tema do assédio, a nós, Gestores de Recursos Humanos, cabe fazer um trabalho constante com os líderes, conscientizar os funcionários dos seus deveres e direitos quanto ao assédio, criar canais internos de denúncias para evitar que situações de assédio moral aumentem a rotatividade de talentos.

No mês passado, em Portugal, o grito de liberdade de expressão fez-se sentir ecoar na comunidade angolana por meio de um esclarecedor e "barulhento" livro de Luzia Moniz, com o título Silenciocracia, Jornabófias e outras mazelas, pela Colecção Novo Jornal. O livro ainda não chegou a Angola, mas sussurrou aos ouvidos dos angolanos mais atentos e que aguardamos ansiosamente o seu lançamento no território onde realmente muitos valores precisam ser revistos e/ou recuperados.

Um livro cujo título é bastante peculiar e de uma escrita irreverente, conforme a personalidade da autora, que, claramente, não é um incentivo à insubmissão ou leviandade de pensar e expressar-se livremente, porém é um alerta de que Angola se apregoa um país de liberdade de expressão e, portanto, deve mostrar-se muito mais capaz de fazer um jornalismo de qualidade, verdade, consistência e eliminar a doença do assédio moral no trabalho dos jornalistas. No caso, a autora focou-se nos núcleos do jornalismo e da política, que é onde a ferida dói mais.

Todavia, em RH este tema preocupa-nos bastante na medida em que o colaborador é contratado para fazer uma função, muito provavelmente capacitou-se, adquiriu conhecimento teórico e prático e, quando se depara com situações em que deve agir como um profissional, é-lhe colocado um travão com a indicação "você é pago para obedecer".

O resultado deste travão é uma das três vias:

1 - que o funcionário faz uma demissão silenciosa, limitando- -se apenas a fazer o mínimo necessário até que tenha uma nova oportunidade de emprego;

2- adapta-se ao sistema e esquece os seus valores e a sua formação, tornando-se igualmente um assediador moral;

3- Despede- -se imediatamente mantendo o seu carácter e protegendo-se das influências negativas. Qualquer uma das opções acarreta riscos de perda significativa de valor moral ou valor financeiro.

Toda a conduta abusiva que, repetidamente, é manifestada por palavras, gestos, comportamentos que possam trazer danos à dignidade, à personalidade, à produção ou ao ambiente de trabalho é considerado assédio moral no trabalho.

Numa globalização crescente, o assédio moral vai ganhando maior incidência, uma vez que o culto ao individualismo, à competitividade e ao capitalismo dão lugar à ambição, a ridicularização do outro, humilhação pública e ameaças de despedimentos. Em Angola, os funcionários não estão isentos deste tipo de prejuízo e, por isso, é importante que o RH e os próprios entendam onde termina o limite do poder directivo e da colaboração horizontal (entre colegas do mesmo nível) para dar lugar ao assédio moral. O que são, na prática, actos de assédio moral no trabalho?

O RH com Amor listou, abaixo, exemplos para responder a essa pergunta:

01. Acusar falsamente de erros que não aconteceram;

02. Não dar instruções correctas para a execução do trabalho;

03. Obrigar ou influenciar o colaborador a demitir-se;

04. Exigir ao funcionário que assuma um erro que não foi seu;

05. Cobrar metas semanais excessivas;

06. Exigir, sem negociar, que o funcionário cumpra horas extras;

07. Ameaçar constantemente a demissão;

08. Retirar ou não fornecer todo o material necessário para a execução das tarefas;

09. Atribuir apelidos pejorativos;

10. Gozar com o colega por não conseguir atingir as metas;

11. Dizer a um funcionário de forma agressiva ou deselegante " cala-te".

12. Gozar com o sotaque provincial dos colegas ou com as suas características físicas que representam as suas raízes;

13. Obrigar o funcionário a mentir ou forjar documentos;

14. Corrigir o funcionário com palavras ofensivas ou negativas à frente dos colegas;

15. Punir ou impedir a promoção de um funcionário por medo de que ele ganhe maior destaque que o superior hierárquico;

16. Elogiar frequentemente um colega subordinado e convidar para ambientes fora do ambiente de trabalho;

17. Expor a vida particular do funcionário no ambiente de trabalho;

18. Prometer promoções e bónus em troca de favores internos.

No ambiente laboral, o poder executivo está para instruir, exigir, disciplinar e retribuir, no entanto, não se deve confundir com o assédio moral. O assédio só existe como facto quando houver provas de "um conjunto de comportamentos e práticas inaceitáveis, isoladas ou continuadas, que têm como objectivo causar danos físicos, psicológicos, económicos ou sexuais ao colaborador" conforme diz a Organização Internacional do Trabalho-OIT (2019)(1) causando o ensejo de demissão ou em casos extremos de pessoas psicologicamente afectadas: vingança.

Pese embora muitos países identifiquem o assédio moral punível por lei com direito a indemnizações, em Angola essa questão ainda é um tanto o quanto omissa na Lei Geral do Trabalho n. 7/15 e a actualização de 2/22 que não dá o devido tratamento a esse assunto, colocando-o no meio de outras questões que, naturalmente, dispersam a necessária atenção. Na Constituição da República de Angola, o assunto é tocado nos artigos sobre "dignidade humana" e faz referência à temática, mas é necessário desmembrar o assunto, dar nomes aos actos, exigir responsabilidades aos agressores e dar o enquadramento e suporte legal necessário à Inspecção Geral do Trabalho e ao Tribunal do Trabalho. É um ponto a melhorar!

Se o assédio moral é considerado pela comunidade de Recursos Humanos como um "monstro silencioso" que, sem fazer barulho, causa danos psicológicos, emocionais, financeiros aos colaboradores, então, que venham mais pan- -africanos como a Luzia Moniz que "escreve como fala de olhos bem abertos e acesos" para denunciar e contribuir de forma prática para a mudança de paradigma numa sociedade que a todos nós pertence.

Enquanto a Lei não actualiza de forma expressiva o tema do assédio, a nós, Gestores de Recursos Humanos, cabe fazer um trabalho constante com os líderes, conscientizar os funcionários dos seus deveres e direitos quanto ao assédio, criar canais internos de denúncias para evitar que situações de assédio moral aumentem a rotatividade de talentos