"Quem não tiver os seguros obrigatórios será impedido de ter um contrato com o Estado"
O sector segurador tem estado numa transformação que visa adaptá-lo a novas realidades e desafios. Filomena Manjata, a quarta PCA da ARSEG, abordou as estratégias para aumentar a taxa de penetração de seguros e a supervisão baseada no risco.
É a primeira mulher a ocupar o cargo de PCA da ARSEG. Quais foram os principais desafios que enfrentou para chegar a esta posição?
Tenho dito, do meu ponto de vista, foi consequência do meu trabalho. Eu sou do sector financeiro e tenho feito toda a minha carreira na ARSEG. Entrei em 2011, como técnica, fiz todo o percurso necessário para atingir este cargo e penso que ser a presidente do conselho de administração em 2025, ano em que se comemora 50 anos de independência, foi só consequência dos desenvolvimentos que nós temos estado a assistir no sector dos seguros, em particular, mas também no País como um todo.
É mais um equilíbrio do género na liderança?
Sim, de algum modo. Sabemos que o Executivo angolano tem estado a apostar muito no equilíbrio de género, tem estado a reconhecer o género feminino na ocupação de cargos de liderança, mas no meu caso, em concreto, acredito que não seja só um equilíbrio de género e que seja também fruto de meritocracia.
Já se passaram 90 dias como PCA. Que avaliação faz do sector?
Este conselho de administração começou a exercer funções em Janeiro de 2025, suportou o seu mandato com a aprovação do plano estratégico 2025-2029. Depois disso, foram escolhidas tarefas prioritárias para que fossem cumpridas num prazo de 100 dias e este plano está 100% executado. Aliás, está disponível publicamente o plano operacional da ARSEG.
Quais são os pontos-chave que tiveram maior ênfase no plano?
Tínhamos como prioridade a regulamentação de alguns aspectos da lei 18/22, que é a lei da actividade seguradora. Como é conhecido, nós optámos, no conselho passado, por estabelecer três regimes: um para os seguros, um para os fundos de pensões e um para a mediação de seguros e de fundos de pensões. Optámos por fazer uma lei para cada regime. Em 2022, aprovámos a Lei 18/22, Lei da Actividade Seguradora e Resseguradora. Em 2024, aprovámos a Lei da Mediação e está na forja a aprovação do regime jurídico dos fundos de pensões. De todo o modo, todas estas legislações precisam ser concretizadas por via de regulamentação. E havia alguns aspectos que não estavam ainda regulamentados, o que não permitia ao mercado de seguros aplicar tudo aquilo que tinha sido contemplado na lei. Então, a principal prioridade nos primeiros 90 dias foi a de regulamentar aquilo que não estava regulamentado e tratarmos alguns outros aspectos internos da casa.
Os números provisórios da ARSEG apontam que os prémios do mercado cresceram 24,9% para 473.729 milhões Kz. A grande verdade é que o sector continua a crescer abaixo da inflação. Como inverter esse longo problema?
Os números falam por si. Sem prejuízo da taxa de penetração do sector de seguros ainda estar aquém daquilo que é desejável, entendemos que temos estado a crescer significativamente. Deixa-me recordar que falei há pouco tempo da aprovação do plano estratégico 2025-2029, cujo objectivo do Executivo é que até 2029 alcancemos uma taxa de penetração de 3%, que é a média da SADC.
Como pensam atingir essa meta?
Temos estado a trabalhar neste sentido e os pontos principais têm sido a maior fiscalização dos seguros obrigatórios. E a ARSEG traçou um plano de dinamização para a fiscalização dos seguros obrigatórios e tem trabalhado afincadamente com o Ministério do Interior e com o Ministério do Trabalho e Segurança Social. Seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais e o seguro automóvel são produtos de massas, e não é nossa prioridade ainda aumentar o número de seguros obrigatórios porque se nós fiscalizarmos aqueles que já estão devidamente regulamentados, certamente conseguiremos atingir a taxa de penetração que o Estado angolano aponta. Nós sabemos também que os desastres rodoviários continuam a ser a segunda maior causa de morte no País, mas ainda temos desafios estruturantes em relação a esta fiscalização. É neste sentido que continuamos a trabalhar com o Ministério do Interior para garantirmos uma fiscalização efectiva do parque automóvel.
É verdade que os seguros obrigatórios impulsionam o crescimento da taxa de penetração. Mas o problema está exactamente na fiscalização, que quase não existe...
Os seguros obrigatórios têm um fim específico. Temos aqui alguns desafios estruturantes no nosso País em concreto, como a baixa taxa de literacia financeira, ou termos um mercado ainda pouco informatizado. Aqui damos a mão à palmatória, pois há muito por fazer para ensinar as pessoas em relação à necessidade e à pertinência de terem seguros. Entretanto, não entendemos de todo que a fiscalização é específica de determinado órgão. A fiscalização devia ser de todos nós. Sem seguro, não se conduz.
Durante este período têm assinado vários protocolos. Tem sido no âmbito do reforço da fiscalização?
A ARSEG tem um protocolo com a Inspecção Geral do Trabalho (IGT) e, neste sentido, temos estado a trabalhar de forma conjunta. É nosso objectivo fazer com que todos os outros entes do Estado se transformem em fiscalizadores indirectos nas suas áreas de actividade. Assinámos circulares conjuntas com o Serviço Nacional de Contratação Pública, o que vai fazer com que ninguém contrate com o Estado se não tiver os seus seguros obrigatórios, com o INAPEM, com o FADA e outras entidades. Temos fé que até 2029 vamos atingir a taxa de penetração esperada pelo Estado angolano, que é muito próxima da média da SADC.
Estamos com uma taxa estagnada nos 0,6% há dois anos.
A nossa taxa de 0,6% não está muito aquém dos outros países da região. A média da SADC é 3%, porque ela é muito influenciada pela média da África do Sul, que varia entre os 11% e 13%, e da Namíbia, por volta de 10%. Mas se formos aqui a realidades muito próximas, como o Botsuana, o Zimbabué, a taxa de penetração está à volta da nossa, o que nos leva a crer que ainda temos muita matéria segurável, muito trabalho pela frente. Sabemos que há muito por fazer.
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