"A comunicação entre seguradoras e segurados ainda é muito pequena e muito fraca"
José Ribeiro de Aguiar Neto (José Aguiar) é fundador do grupo Unisaúde, das quais fazem parte Unisaúde Gestão, Unisaúde Seguros e Unisaúde Clínicas. O médico cirurgião torácico falou dos projectos da mais recente seguradora do País e aponta caminhos para o aumento da taxa de penetração no sector.
Os prémios do mercado segurador cresceram 24,7% para 473.729 milhões Kz Kz, em 2024. Ainda assim, o sector continua a ter um crescimento real negativo. Como é que se inverte esta situação?
Eu entendo que o crescimento do mercado segurador está intimamente relacionado à questão do desenvolvimento da economia. O que Angola está viver é muito diferente do passado, onde crescia a dois dígitos e agora vem com crescimento bastante limitado. E não há, a curto prazo, nenhuma tendência para reverter esse cenário. Aparentemente, vamos continuar assim durante algum tempo. Nos países mais desenvolvidos o seguro é uma cultura. Se olharmos, por exemplo, a situação do seguro de saúde, a penetração em países mais desenvolvidos chega a 50%. No Brasil é 25%, em Portugal é 20%. Aqui estima-se que tenhamos hoje cerca de 360 mil vidas com o seguro-saúde. No ano passado, tivemos a mesma estimativa, quer dizer, aumentaram os prémios, mas aumentaram acompanhando a inflação, ou seja, é uma consequência do aumento de preço das clínicas, principalmente, porque não há uma expansão do mercado.
Se olharmos para os ramos que impulsionam o crescimento do sector estão exactamente o doença (com 169.579 milhões Kz) e petroquímica (85.110 milhões Kz) ambos com um crescimento de 37% acima da média dos ramos Não Vida. Não é altura de se apostar também noutros ramos?
Claro que sim. Posso citar aqui o PCA da Sanlam Allianz, Armando Mota, que no Fórum de Seguro há alguns anos atrás, mencionou que as seguradoras queixavam-se da falta de fiscalização do Governo dos seguros obrigatórios . E ele dizia, nós não vamos parar de reclamar e cobrar que o Governo, mas também temos que ser criativos e desenvolver o mercado. Esse é um aspecto importante. Não vejo que o seguro de saúde esteja a crescer, antes tem vindo a manter-se. A expansão dos prémios de saúde, um pouco maior do que os prémios geral do mercado, é porque houve uma grande desvalorização da moeda em 2023, o que leva ao aumento dos preços dos serviços médicos, pressionando o aumento do prêmio do seguro.
O sector precisa de ser mais ousado para apostar noutros ramos?
Acho que é preciso apostar nos outros ramos, mas isso, como nós somos especializados em Saúde e no Acidente de Trabalho, para nós significa fazer melhor e fazer de uma forma inovadora. É nisso que estamos a apostar.
Como é que avalia a prestação do serviço do sector segurador?
Nós estamos num segmento onde a participação e a importância do serviço é maior. Aquela parte que tem a ver com a incerteza, aquilo que não sei que vai acontecer, o internamento, por exemplo. As pessoas que têm um problema cardíaco não sabiam que iriam ter. Essa parte incerta que está relacionada mais ao internamento. Então, o internamento representa 15% aproximadamente das despesas com saúde e apenas 1%, um pouco mais, do número de eventos. E o resto são serviços, porque quando o segurado vai a uma clínica para fazer uma consulta ou um exame, isso é serviço. E são serviços estáveis, serviços que quando a gente acompanha mensalmente dentro de uma mesma população, é um número muito estável. Tanto é que é fácil para a seguradora prever o que vai acontecer.
Os microsseguros podem ser uma solução para o aumento da taxa de penetração?
Eu acredito que o principal factor que leva as empresas ou as pessoas a não contratar um seguro é a falta de recurso orçamentado para o pagar. Então, desenvolver seguros de baixo preço e baixo custo é fundamental. Mas é importante dizer que o problema é que quando se pensa na óptica do seguro de saúde, toda vez que se pensa em reduzir o prémio, reduz-se a cobertura. O que acontece quando você tem o seguro é que os limites de cobertura são iguais para todos, para as pessoas doentes e para as sadias. As pessoas sadias acabam tendo um uso voluntário. Elas decidem ir à clínica, decidem fazer uma consulta ou um exame e não estão propriamente doentes. As pessoas que têm uma doença como a tensão alta, como o diabetes ou outro problema qualquer, elas efectivamente precisam usar. E quando você reduz a cobertura elas acabam ficam fora. Então, há uma incoerência, porque você não trata, não resolve o problema onde precisa ser resolvido. Então, é preciso reinventar esse negócio para permitir que se crie produtos de baixo preço, mas que resolvam o problema do cliente. É nisso que estamos a trabalhar, desenvolver produtos que possam atender a essa necessidade específica.
Ainda que se baixe o preço, a verdade é que temos pessoas e empresas que acreditam que o seguro é um custo.
Também tem esse impasse. Esse é um dilema do mercado, especialmente no seguro de saúde. Quem não pretende utilizar, acha que é um custo e prefere não comprar. Se ele recebe da empresa, óptimo. Quem precisa, dispõe-se a pagar. Mas o que acontece é que se aquela pessoa está comprar para usar, então ela está comprando o acesso ao serviço e não ao seguro, e não à protecção para uma eventualidade desconhecida. Então o que faz isso? Essa população acaba aumentando a utilização e fazendo com que esses produtos se tornem mais caros. Nós temos que encontrar modelos que permitam equalizar essas situações. Eu vou tratar as pessoas que estão doentes e eu vou oferecer um produto que resolva o problema delas, mas que também caibam no bolso do paciente.
Ninguém compra o que não conhece e nem sabe. Como avalia a comunicação das seguradoras com os segurados através de publicidades e outros canais?
Realmente essa comunicação é muito pequena e muito fraca. Não só na forma de como usar o seguro, mas também para aqueles ramos que têm ainda uma penetração muito menor do que deveriam, como é o caso dos seguros obrigatórios, onde a penetração ainda é baixa. As empresas ainda não perceberam o valor do seguros, então temos que fazer um esforço na divulgação da importância do seguro e fazer com que as pessoas contratem o seguro que é obrigatório, mas conscientes dos benefícios que podem ter.
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