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Grande Entrevista

"O não pagamento à Segurança Social é uma das matérias que não perdoamos às empresas"

VASSILI AGOSTINHO, INSPECTOR GERAL DE TRABALHO

O estatuto orgânico e a actividade da Inspecção Geral de Trabalho sofreu uma alteração importante no ano passado com a incorporação do que era o Centro de Segurança e Saúde no Trabalho, dando-lhe novas competências e uma abrangência maior no controlo das empresas. Mas tem muitas mais actividades.

Comecemos pelo princípio. Houve uma mudança recente na estrutura da Inspecção Geral de Trabalho. A que níveis?

A alteração na estrutura orgânica da Inspecção Geral de Trabalho resulta do Decreto Presidencial n.º 90/22 de 18 de Abril. Esta alteração teve como justificação as mudanças que estão a ser feitas no âmbito da reforma administrativa, sendo que no nosso sector foi extinto o Centro de Segurança e Saúde no Trabalho. Todas as atribuições, o património e o pessoal transferiram-se para a Inspecção Geral de Trabalho desde o ano passado. O estatuto orgânico também foi alargado, com mais três departamentos e passámos a ter três executivos e quatro agrupados.

Em termos operacionais houve alguma mudança?

O alargamento das competências da Inspecção Geral de Trabalho para aquilo que era responsabilidade do Centro de Saúde e Segurança no Trabalho. Passou para nós e temos estado a desempenhar essas funções.

De acordo com o relatório de 2022, o ano passado houve uma redução de inspecções de 10%.

Realmente há uma diferença. Estamos a falar de 9.088 em 2021 para 8.296 em 2022. Está relacionado com questões operacionais. A actividade inspectiva é a nível nacional, porque estamos representados em todas as províncias do País e, nesta ordem de ideias, as nossas atribuições estendem- -se aos municípios. O ano passado tivemos um abrandamento relativamente às visitas em alguns municípios de algumas províncias, o que justifica esta redução do número de visitas.

Como estas visitas se reflectem na vida dos trabalhadores?

As visitas inspectivas incidem sobre dois aspectos: a componente técnica, para avaliar as condições de trabalho (questões de sinalização, iluminação), ou seja, todas as condições que podem pôr em causa a integridade física dos trabalhadores. E o aspecto social relacionado com as inscrições dos trabalhadores na Segurança Social, a questão do pagamento pontual dos salários, seguro contra risco de acidente de trabalho e doença profissionais, e o cumprimento do qualificador ocupacional.

Todos os anos o não pagamento à Segurança Social aparece como o factor com maior número de infracções.

O não pagamento à Segurança Social viola um direito fundamental dos trabalhadores que está previsto na Constituição. É uma das matérias que praticamente não perdoamos. Quando constatamos uma infracção de não pagamento ou não inscrição no INSS agimos de forma coerciva ou definimos um prazo para que regularizem a situação. As multas que estabelecemos depois têm muito a ver com a gravidade da infracção que as entidades empregadoras cometem, com a reincidência, com o número de trabalhadores que estão em falta na lista do INSS, etc. Mas poderia falar também da falta de seguro de acidentes de trabalho e doenças Profissionais, onde somos igualmente reactivos.

Quer dizer que há infracções em que não há perdão e outras onde actuam de forma mais pedagógica? Por exemplo, a questão dos exames médicos periódicos. Imagino que seja muito difícil às empresas cumprirem isto.

Não, porque está em causa a integridade física do trabalhador. Vamos supor que um determinado trabalhador de uma fábrica, de uma determinada categoria exposta ao risco, ao ser admitido não faz este exame obrigatório. Quando sai para outra empresa também não faz o exame de admissão e, entretanto, desenvolve uma doença. Não é possível saber em que empresa desenvolveu essa patologia. Se a empresa tivesse cumprido com este dispositivo legal (avaliação pré-admissão) evitaria muitas situações de conflito.

Quando vocês descobrem que não há inscrição na Segurança Social isso é comunicado ao INSS?

É comunicado. Mas deixe-me dizer que o INSS também tem o seu departamento de inspecção. Em todas as províncias há essa ligação institucional entre a IGT e o INSS.

Há infracções que em momentos de crise são muito difíceis de identificar?

Tivemos isso agora com a pandemia, relacionado com a questão dos exames periódicos que as empresas não conseguiram fazer. E deixe-me dizer que durante este período fomos bastantes pedagógicos. Claro que não podíamos ser para todo o sempre. Demos uma moratória durante aquele período para o seu cumprimento, mas agora já passou.

Comparando com outros anos, considera que as infracções relacionadas com os acidentes de trabalho baixaram?

Não considero que tenha sido uma baixa. O que acontece com os acidentes de trabalho é que as empresas são obrigadas a comunicar e esta falta de comunicação tem influência nos números. Ou seja, não se pode dizer se baixou ou aumentou, eu diria que as empresas comunicaram menos. Como num outro período podem comunicar mais.

As seguradoras têm aqui um papel importante de sensibilização.

Temos estado a fazer um trabalho conjunto, inclusive temos de alterar a legislação neste sentido, porque se as empresas são obrigadas a ter um seguro de acidentes e doença profissional, para o caso de acidentes em que a seguradora cubra os danos, elas também devem passar a comunicar à Inspecção Geral de Trabalho. Hoje não o fazem e há muitas situações que não tomamos conhecimento.

Muitas vezes, há um entendimento entre o empregado e o patrão, porque este paga as despesas do acidente. Como é que lidam com estes casos?

Sempre que descobrimos casos de fuga à lei não temos como não agir de forma coerciva. Mas a ausência de seguro é um risco maior para o próprio empregador, porque se o trabalhador tiver algum acidente, a própria Lei Geral do Trabalho recomenda que o empregador tem que arcar com as responsabilidades, tem custos muito maiores. Inclusive se se provar que houve dolo ou negligência por parte do empregador, ele também é responsabilizado criminalmente.

Aqui voltamos a invocar a responsabilidade dos tribunais.

Pois! Mas deixe-me dizer que temos estado a trabalhar com a Procuradoria-Geral da República, na sala do trabalho, por causa de muitos processos em que o tribunal tem de definir se existe incapacidade laboral por acidente de trabalho.

A inspecção sobre os acidentes de trabalho às empresas acontece para inspeccionar os acidentes ou para constatar a subscrição do seguro obrigatório de acidentes de trabalho e doenças profissionais às empresas?

Em decorrência de um acidente de trabalho, investigamos as causas do acidente. O que é que derivou, será que foi um acto inseguro do próprio trabalhador, será que o empregador tinha as condições criadas, será que o trabalhador no desempenho da sua actividade ter-se-á descuidado? A investigação vai nesse sentido, para se ver o nexo de causalidade relativamente ao dano.

(Leia o artigo integral na edição 717 do Expansão, desta sexta-feira, dia 24 de Março de 2023, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)