Saltar para conteúdo da página

Logo Jornal EXPANSÃO

EXPANSÃO - Página Inicial

Opinião

Desafios e perspectivas de reforma do Regime Jurídico de Protecção de Dados Pessoais em Angola

CONVIDADO

Considerando que o Projecto de Revisão da Lei de Proteção de Dados Pessoais encontra-se em processo de consulta pública, sugerimos que a proposta contemple, de maneira clara e específica, disposições voltadas para a protecção de dados para o sector financeiro, tendo em vista que este lida extensivamente com dados de carácter pessoal, muitas vezes altamente sensíveis. Tal abordagem garantiria maior segurança e conformidade no tratamento de informações;

A protecção de dados está consagrada no catálogo dos Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais da Constituição da República de Angola [art. 32.º da nossa Magna Carta]. Este direito assegura ao cidadão a prerrogativa de opor-se à utilização dos seus dados pessoais para finalidades diferentes daquelas que justificaram a sua obtenção.

A evolução acelerada das tecnologias de informação a nível global (cerca de 64% da população está conectada à internet), aliada à crescente importância da segurança cibernética em Angola, tem transformado profundamente diversas dimensões da vida humana, com especial ênfase nos sectores da comunicação, do comércio e das relações laborais. Nessa conformidade, a protecção de dados pessoais tornou-se uma temática central, visto que os dados pessoais passaram a constituir um recurso estratégico, essencial para alimentar e impulsionar actividades administrativas e económicas. Este cenário é particularmente evidenciado pelo desenvolvimento de plataformas digitais de prestação de serviços em sectores cruciais, reforçando a interdependência entre inovação tecnológica e gestão eficiente de informações sensíveis.

No contexto actual, a Lei da Protecção de Dados Pessoais de Angola (Lei n.º 22/11, de 17 de Junho) mostra-se desactualizada frente aos novos desafios impostos pela evolução tecnológica e pelas dinâmicas globais de tratamento de dados. Torna-se, portanto, imprescindível revisitar este diploma legal, adoptando uma abordagem mais articulada e ancorada em medidas robustas que estejam alinhadas não apenas com as normas internacionais, mas também com as melhores práticas em matéria de privacidade e protecção de dados. Assim, embora a Lei n.º 22/11, de 17 de Junho, se revele, em grande medida, munida de instrumentos capazes de assegurar uma considerável protecção dos dados pessoais, os desafios impostos pelas tecnologias contemporâneas exigem o estabelecimento de novas garantias fundamentais.

Em 2023, por exemplo, diversos países africanos deram passos significativos em matéria de protecção de dados pessoais, reflectindo a crescente preocupação com a privacidade e a segurança das informações. Destaca- -se a entrada em vigor de novas legislações na Tanzânia, Nigéria e Argélia, bem como as alterações substanciais efectuadas na Lei de Protecção de Dados Pessoais do Gana e a concretização, em Cabo-Verde, de uma alteração significativa da

Lei da Protecção de Dados, através da publicação da Lei n.º 121/IX/2021, de 17 de Março, sendo estas, no rol de várias, as principais alterações: i) Protecção dos dados pessoais respeitante às pessoas (singulares) que se encontrem em Cabo Verde, independentemente do local em que os dados são tratados, com a consequente aplicação da Lei da Protecção de Dados aos responsáveis pelo tratamento (ou às entidades que tratem os dados por conta daqueles) estabelecidos fora do território nacional que recorram a dados pessoais daquelas pessoas, sempre que a actividade de tratamento respeite a oferta de bens ou serviços a esses titulares (mesmo que gratuitamente) ou ao controlo do seu comportamento que ocorra em território cabo-verdiano; ii) Introdução da figura do encarregado da protecção de dados, vulgo DPO (Data Protection Officer) e dos casos em que a sua designação é obrigatória. Essas iniciativas demonstram um esforço colectivo em alinhar as normas nacionais dos países referidos com os padrões internacionais.

Conclusão

Por fim, considerando que o Projecto de Revisão da Lei de Proteção de Dados Pessoais encontra-se em processo de consulta pública, sugerimos que a proposta contemple, de maneira clara e específica, disposições voltadas para a protecção de dados para o sector financeiro, tendo em vista que este lida extensivamente com dados de carácter pessoal, muitas vezes altamente sensíveis. Tal abordagem garantiria maior segurança e conformidade no tratamento de informações;

Em África, destaca-se o exemplo de sucesso das Ilhas Maurícias, que, em Novembro de 2023, publicou um guia abrangente sobre o tratamento de dados pessoais no sector financeiro. Este guia trouxe contribuições relevantes para as fintechs (tecnologias financeiras), incentivando-as a adoptar práticas inovadoras e seguras, com destaque para a implementação do mecanismo de privacy by design, promovendo, desde a concepção de sistemas, à protecção da privacidade como um princípio central;

Outrossim, recomendamos que, assim que o Projecto de Revisão da Lei de Protecção de Dados Pessoais for aprovado, a Agência de Protecção de Dados adopte uma abordagem proactiva, instando todas as organizações públicas e privadas a implementarem, de imediato, planos detalhados de adaptação interna às novas disposições legais. Para isso, a experiência de Cabo Verde, com a entrada em vigor da Lei n.º 121/IX/2021, pode servir como referência valiosa, visto que lá se priorizou a conjugação de esforços para assegurar um nível elevado de conformidade normativa;

Leia o artigo integral na edição 820 do Expansão, de sexta-feira, dia 04 de Abril de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)

*Salomão Abílio, Jurista

Logo Jornal EXPANSÃO Newsletter gratuita
Edição da Semana

Receba diariamente por email as principais notícias de Angola e do Mundo