Contratos públicos reportados representam apenas 8% do total que o Estado gastou em 2024
Ao todo, o 'polícia' da contratação pública registou 4.389 aberturas de procedimentos contratuais no ano passado, mas depois as entidades públicas apenas lhe comunicaram 183 adjudicações. Contas feitas, o SNCP apurou 507,3 mil milhões Kz em contratações públicas, equivalente a 8% dos 6,3 biliões Kz que o Estado gastou.
O valor dos contratos detectados ou comunicados ao Serviço Nacional da Contratação Pública (SNCP) no ano passado corresponde a apenas a 8% do total que os vários órgãos do Estado gastaram em obras, bens e serviços em 2024. De acordo com os relatórios de execução orçamental de 2024, publicados no site do MinFin e compilados pelo Expansão, o Estado gastou no ano passado 1.172.530 milhões Kz em Bens, 1.709.230 milhões em serviços (ambos despesas correntes) e também gastou 3.454.502 milhões em investimentos (despesas de capital).
Contas feitas, o Estado gastou o ano passado um total de 6,3 biliões Kz nestas despesas, valor que contrasta com os 507.325 milhões Kz, que o SNCP registou em 2024, de acordo com o Relatório Anual da Contratação Pública Angolana (RACPA) do ano passado.
O SNCP justifica o baixo registo de contratos com a Lei dos Contratos Públicos que apenas obriga à comunicação ao órgão responsável pela regulação e supervisão da contratação pública as adjudicações de propostas para celebração de contratos de valor igual ou superior a 182 milhões Kz, embora a decisão de contratar deva ser obrigatoriamente comunicada, o que nem sempre acontece. A
possibilidade de não serem comunicadas ao SNCP propostas para celebração de contratos de valor igual ou superior a 182 milhões Kz abre espaço para que não se conheça quanto os órgãos do Estado - ministérios, governos provinciais, institutos, entre outros - gastam anualmente com a contratação pública e a que compram, segundo especialistas.
"Esta possibilidade é uma porta aberta para os gestores e é permissiva a irregularidades. Existindo uma instituição que vela pela contratação pública, os gestores deveriam ser obrigados a reportar todos os contratos, independentemente do valor dos mesmos", disse o consultor Pedro Santos.
Para este académico, a contratação pública deve ser transparente e a acessível a um "clique", para melhor controlo dos gastos públicos. "Os dados da contratação pública devem estar disponíveis em sites dos órgãos responsáveis por estes serviços para qualquer cidadão interessado, caso queira, consultar. Esta abertura permitiria saber quanto foi realmente gasto, o que não acontece. Pouco se sabe onde se gasta de facto o dinheiro público", disse.
Uma vez que a Lei dos Contratos Públicos não obriga à comunicação ao SNCP de adjudicações de propostas para celebração de contratos de valor igual ou superior a 182 milhões Kz, o jurista Alves Silva, defende que é necessária uma revisão à lei.
"O facto de a lei não obrigar, não significa que os servidores públicos não comuniquem. Mas para não ficar à mercê da vontade dos servidores públicos, a lei devia mesmo obrigar a esta comunicação. É altura de proceder à revisão da lei para que o SNCP consiga estar mais a par da contratação pública que é feita", defendeu.
O próprio Ministério das Finanças, em resposta a questões do Expansão, admite ser necessária uma revisão à lei. Quando questionado sobre o que deve ser feito para que se verifique uma maior comunicação por parte dos diferentes órgãos do Estado, o MinFin defende uma "alteração ou revisão da Lei dos Contratos Públicos, para que seja legalmente plasmada a obrigação das Entidades Públicas Contratantes (EPC) comunicarem a adjudicação de contratos ao órgão regulador, independentemente do valor do contrato"
Leia o artigo integral na edição 832 do Expansão, de Sexta-feira, dia 27 de Junho de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)