Bancos com vários meses de atrasos nas transferências para o exterior
Queda do preço e da produção de petróleo estão na base da fraca oferta de divisas por parte do Tesouro Nacional. Instituições bancárias admitem dificuldades para obter moeda estrangeira, enquanto os clientes desesperam durante semanas para verem as suas transferências concretizadas. E o Natal está aí à porta.
Empresas e particulares continuam com dificuldades na realização de transferências para o exterior do País, isto porque os bancos estão com menos disponibilidade de moeda estrangeira para atender às necessidades dos clientes, e priorizam as operações em função dos montantes solicitados e da importância do cliente, segundo apurou o Expansão. Há clientes bancários com transferências suspensas há três meses.
As reclamações são de clientes de vários bancos comerciais que actuam no mercado nacional, sobretudo de empresários e de cidadãos nacionais e residentes estrangeiros que têm necessidade de transferir recursos para o exterior. O regulamento estabelece um prazo de cinco dias úteis, e há quem esteja à espera há mais de três meses.
E a pressão nos bancos tende a aumentar na época festiva, já que as empresas e particulares tendem a procurar mais por divisas nestas alturas. Isto acontece porque os bancos comerciais tiveram maior dificuldade em captar divisas, e por registarem uma maior procura nos últimos tempos. E na base desta escassez de divisas é a quebra de receitas de petróleo devido à queda dos preços do petróleo nos mercados internacionais e à queda da produção petrolífera nacional, que está em declínio desde 2016.
É através da exportação de petróleo que dá entrada no País a maior parte das divisas. Associado a isto está também a amortização da dívida pública externa a credores internacionais, e o pagamento de juros, uma vez que o pagamento é feito em moeda estrangeira. Isso tem feito com que o Tesouro vá reduzir a oferta de divisas aos bancos. Só que esta elevada procura por divisões não se reflete na taxa de câmbio.
As estatísticas diárias do BNA apontam que a taxa de câmbio está praticamente parada há um ano, já que desde o dia 01 de Novembro a moeda nacional 'estacionou' à volta dos 912 Kz por dólar (ver gráficos). Tal como explica o economista Heitor Carvalho, há mais procura do que a oferta de divisas, uma taxa de câmbio que deveria deteriorar-se.
"Na perspectiva do mercado interno, a taxa de câmbio deve manter-se ou deteriorar-se menos do que é exigido pela oferta e procura de divisas. Se deixarmos deteriorar-nos demasiado, aumentaremos a inflação enormemente, o que aumentaremos a procura de importações e aumentaremos a procura de divisas e cairemos na espiral negativa", explicou.
Assim, o economista entende que a solução é a redução da despesa pública inútil, fixando os rendimentos do petróleo disponíveis para o Governo não equivalente a um preço do barril de 50 USD. "Isso estabilizaria os gastos do Governo, obrigaria a não gastar à toa, como tem sido prático, e permitiria aumentar as reservas no BNA para aguentar a taxa de câmbio real e, simultaneamente, utilizar uma parte dos rendimentos para reduzir a pública", apontou.
Os dados mais recentes referentes às transações na plataforma Bloomberg FXGO (onde fazem parte o BNA, Tesouro Nacional, petrolíferas, diamantíferas e seguras), apontam que no I semestre os bancos comparam menos 187,0 milhões de USD face ao último semestre do ano passado. Ainda assim, o sector petrolífero é o que vende divisas ao banca angolana, tendo representado 47% das divisas adquiridas pelo banca na plataforma Bloomberg. De acordo com o Instrutivo n.º 01/20, de 10 de Janeiro, o Banco Nacional de Angola (BNA) distribuiu um prazo máximo de cinco dias úteis, contados dos dados da recepção da instrução, para que os bancos executem operações de venda de moeda estrangeira e operações cambiais associadas aos seus clientes. Mas quase nunca esses prazos são cumpridos.
"Tenho estado à espera há oito semanas para ver as minhas transferências efectuadas", disse um particular residente, que tem responsabilidades no exterior, realçando que os bancos prestam um "mau serviço", essencialmente na medida em que não conseguem comunicar efectivamente aos clientes depois de passarem o período legal para execução da transferência.
"Tudo bem que sabemos que a situação de divisas no mercado não é a melhor, mas deviam saber gerir melhor as expectativas. Um caso que me aconteceu foi por não ter o dinheiro todo na conta na data em que foi decidido executar a transferência, não fui notificado e foi cancelado a operação", explicou.
Já a ECODIMA (Associação de Empresas de Comércio e Distribuição Moderna de Angola), diz que tem vindo a acompanhar, "com profunda preocupação", as dificuldades enfrentadas por várias empresas do sector formal no processamento de transferências de divisas para o exterior, que de acordo com os relatos consistentes de diversos associados, a duração real dessas transferências tem sido extremamente volátil e, muito superior aos padrões internacionais, que, em média levam até 72 horas.
"Em Angola, as transferências demoradas regularmente entre 45 e 60 dias, podendo, em alguns casos, ultrapassar esse prazo e chegar a várias semanas ou até meses, conforme o banco intermediário, o tipo de operação e o destino da transferência. Ainda que a situação tenha evoluído face a períodos anteriores, quando chegou a registar-se atrasos de 3 a 6 meses, no entanto, continua a haver constrangimentos de várias ordens, que afectam o funcionamento normal das empresas", aponta a associação em resposta ao Expansão.
A ECODIMA entende que o impacto económico e empresarial dos atrasos nas transferências cambiais no País é profundo, sistémico e multidimensional, na medida em que afecta tanto a confiança internacional como a dinâmica interna das empresas.
Leia o artigo integral na edição 851 do Expansão, sexta-feira, dia 07 de Novembro, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)











