Economia com makas
Adicionalmente, Angola é frequentemente classificada como um Estado frágil, decorrente da sua fragilidade institucional que se constitui como um risco e um entrave para atracção de investimento e consequentemente para o desenvolvimento do país.
Parabéns Carlos Rosado de Carvalho (CRC) pela iniciativa, parabéns pelo diálogo de proximidade, aliás a moldura humana presente ilustrou bem o interesse e a necessidade que temos de conhecer mais de perto aqueles nos lideram. Permitiu ver de perto, mas não de perceber o que pensam, pois, as mensagens deixadas entre linhas são apenas "a da voz dos auxiliares". No discurso positivo, com slides bem construídos e politicamente correctos, preocupa-me que o auxiliar da coordenação económica tenha apresentado a visão económica (passado, presente e futuro) de Angola sem tocar na variável demográfica.
Falar sobre a equação do crescimento económico sem incluir o factor demográfico, especialmente no contexto de Angola, é como tentar fazer uma receita sem considerar o ingrediente principal. A equação de crescimento tal como desenvolvida pelo economista e Prémio Nobel Robert Solow (que deve ter dado mais uma volta na tumba), considera o Produto Interno Bruto (PIB) como resultado da acumulação de capital, do crescimento populacional e do progresso tecnológico. Solow na sua análise mostrou que, para um país crescer sustentadamente, precisa de investir não só em capital físico, mas também em capital humano e inovação. Ora, quando observamos Angola, percebemos rapidamente que a demografia é um factor incontornável para entender o presente e, sobretudo, o futuro económico do país.
Angola é um país com uma das populações mais jovens e de crescimento mais acelerado do mundo, onde a taxa de crescimento populacional ronda os 3% ao ano(1). Angola vive hoje um dos maiores paradoxos do desenvolvimento: uma população extremamente jovem e dinâmica, mas com um sistema sócio-económico ainda pouco preparado para aproveitar esse potencial. Segundo os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE) e do UNFPA Angola (2023), cerca de 65% da população angolana tem menos de 25 anos. Esta juventude representa uma força poderosa e uma oportunidade única, mas também um risco se não forem criadas condições para a sua plena inserção económica e social. Se o crescimento do PIB não acompanhar esse crescimento demográfico, o resultado é simples: empobrecimento(2).
Na visão do auxiliar da coordenação económica, na tal economia "sem" makas, as tabelas do PIB angolano podem até mostrar crescimentos positivos em certos anos 2%, 3%, talvez até 4%, mas esses números tornam-se irrelevantes quando comparados com a taxa de crescimento populacional. Por exemplo, o PIB per capita, que mede o rendimento médio por habitante, não acompanha esse ritmo. Na verdade, quando a economia cresce menos do que a população, o que temos é uma queda no rendimento médio real. Ou seja, o bolo até pode estar a crescer, mas está a ser dividido por um número cada vez maior de pessoas e cada fatia torna-se mais pequena. Em 2018, os dados indicavam que cerca de 16,5 milhões de angolanos, ou seja 52,9% da população, viviam com menos de 3,65 dólares por pessoa por dia(3) .
A queda da PIB per capita reflecte também o deteriorar das perspectivas de emprego e os altos preços dos alimentos que têm pressionado o poder de compra das famílias. Isso também contribuiu para o aumento da pobreza, com projecções indicando que, até 2024, mais de um terço da população estaria a viver com menos de 2,15 dólares por dia(4). Os indicadores ilustram como o PIB per capita e o crescimento do PIB têm confirmado o empobrecimento sem falar na inflação ....E há mais: o coeficiente de GINI, que mede a desigualdade, permanece alto em Angola em geral, com o valor de 0,532(5). Mesmo que o PIB cresça, se a distribuição dessa riqueza continuar desigual, a maioria da população não sentirá melhoria nas suas condições de vida. A prosperidade concentra-se em poucas mãos, enquanto a maioria vive numa situação de vulnerabilidade..., mas isso é outra maka económica. Além disso, há uma crónica falta de despesas em investimento. O orçamento público angolano continua altamente dependente do sector petrolífero e com grande fatia dedicada às despesas correntes (salários, subsídios e dívidas) em vez de apostar em infraestruturas produtivas, educação de qualidade, saúde ou ciência e tecnologia(6). Sem investimento estrutural, a produtividade não aumenta e o crescimento de longo prazo torna-se impossível.
Seguindo a lógica de Solow, um crescimento sustentável exige acumulação de capital produtivo, inovação e uma gestão demográfica inteligente.
Em Angola, o crescimento económico continuará limitado, ou até piora, se não se reconhecer que o desafio é duplo: aumentar a riqueza criada e garantir que essa riqueza é repartida por uma população que não pára de crescer. Ignorar esse factor é aceitar, passivamente, uma trajectória de empobrecimento contínuo.
Leia o artigo integral na edição 825 do Expansão, de Sexta-feira, dia 09 de Maio de 2025, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)