Então, para onde vai a economia angolana?
Ficamos muito distantes de saber como a estrutura da economia angolana será de facto alterada nos próximos anos, que sectores vão liderar essa transformação e de que forma a liberdade económica será assegurada? Contudo, de uma coisa podemos ter certeza, sabendo que o Executivo está a gerir 1400 projectos simultaneamente, o desenvolvimento que se deseja sustentável, inclusivo e articulado para Angola, vai levar muito mais tempo do que o desejável!
Na semana passada tivemos o privilégio de assistir a mais uma edição do "Conversas Economia 100 Makas", onde o ministro de Estado para a Coordenação Económica, enquanto palestrante, abordou o tema "Onde está e para onde vai a economia angolana". Estes eventos têm servido também, para facilitar o diálogo, de uma forma mais descontraída, entre os principais membros da governação e governados. Nesta edição vamos reflectir sobre o que nos foi apresentado.
A apresentação teve como ponto de partida o "choque petrolífero de 2014-2017", caracterizado pela queda do preço do barril de petróleo de 109 USD em 2014 para 30 USD no início de 2016, seguindo-se depois um período de recuperação. Ora bem, temos defendido nas nossas análises que o verdadeiro problema não foi o "choque petrolífero" como tal, mas, ao invés, a fraca diversificação que a economia registava na altura (e regista até hoje).
A administração Dos Santos perdeu uma boa oportunidade de levar avante este processo na primeira década do Séc XXI. Abrimos aqui um parêntesis para explicar que se, por um lado, o processo de reconstrução nacional apenas ganhou tracção depois de 2007, com os financiamentos da China, por outro lado, a política de "Kwanza forte" adoptada em 2001 com o intuito de facilitar a importação de bens de capital não deu os resultados esperados por falta de acompanhamento sério.
Faltou por parte da administração o cuidado e ver se os bens de capital estavam a ser importados tal como preconizado ou se, ao invés, tal como aconteceu, estava a ser aproveitado o "Kwanza forte" para facilitar a importação de bens de consumo corrente.
É preciso reconhecer que se tratou de uma falha da administração que, por exemplo, permitiu a degradação das Reservas Internacionais de 31.820 milhões USD em 2014 para 18228 milhões em 2017. Esta situação fez com que se mostrasse insustentável manter a política cambial como âncora para a estabilidade macroeconómica, levando mesmo à adopção de um câmbio mais flexível.
O ministro de Estado indicou igualmente algumas das medidas de aceleração económica adoptadas pelo Executivo no período de 2018-2024. Por ex., destacou a isenção de vistos de curta duração sem, no entanto, apresentar o impacto económico de tal medida, o facto de hoje ser possível registar uma empresa em 24 horas (presencial, 48 horas online) e que as licenças de construção eram emitidas até 30 dias é positivo. Todavia, ficamos sem saber o impacto dessa melhoria no ambiente de negócios ou no investimento directo estrangeiro. Afinal, o Expansão mostra desinvestimento nos últimos 10 anos.
Sobre o aumento da inflação no mês de Maio de 2023, ficámos a saber que o choque afinal era evitável atendendo que este aumento se deveu, segundo explicação, ao (1) início da remoção dos subsídios aos combustíveis, (2) forte desvalorização da moeda devido à redução da oferta causada pela retoma do serviço da dívida externa.
Ora bem, se o Executivo sabia que iria retomar o serviço da dívida externa (após a suspensão devido à pandemia da Covid-19), porque razão não antecipou a remoção dos subsídios para 2022? Sabemos que 2022 foi um ano eleitoral e, como acontece em outras partes do mundo, a governação estava mais preocupada em assegurar uma vitória eleitoral do que "fazer a coisa certa". Uma prova de que ao contrário do que nos sugere Adam Smith (que o auto-interesse resulta num bem colectivo) neste caso concreto, os interesses pessoais (de grupo) sobrepuseram-se aos interesses da maioria, resultando na deterioração da qualidade de vida dos angolanos (independentemente da sua cor partidária).
O facto de a indústria transformadora ter beneficiado de 47,25% do crédito do sector real e a agricultura 20,9%, indica que a indústria do empacotamento tem uma grande preponderância no País. Angola ainda está muito distante de produzir localmente grande parte dos alimentos que a sua população consome.
Este facto remete-nos para a dura realidade de que a governação parece não perceber que o País precisa de aumentar a produtividade no sector agrícola. Foi-nos dito que a Segurança Alimentar manter-se-ia como "âncora do desenvolvimento económico e social" e que cerca de 3 milhões de famílias vivem no campo. O que não nos foi dito era que essas famílias praticam uma agricultura de sequeiro (dependente das chuvas) e num contexto de alteração climática é inconcebível um País garantir a sua segurança alimentar nestas condições.
Enfim, o evento deu para obtermos alguns esclarecimentos sobre o que aconteceu com a economia, mas, ficamos muito distantes de saber como a estrutura da economia angolana será de facto alterada nos próximos anos, que sectores vão liderar essa transformação e de que forma a liberdade económica será assegurada? Contudo, de uma coisa podemos ter certeza, sabendo que o Executivo está a gerir 1400 projectos simultaneamente, o desenvolvimento que se deseja sustentável, inclusivo e articulado para Angola, vai levar muito mais tempo do que o desejável!