Queda do Kwanza e falta de liquidez travam recuperação do imobiliário
A crise cambial e a reduzida capacidade financeira da população condiciona a aposta no mercado imobiliário. No segmento premium há oferta em excesso para a fraca procura. Mas é a falta de oferta para a classe média que deveria ser preenchida por apostas dos promotores imobiliários. Mas não está a acontecer.
O imobiliário continua a indexar os valores de venda e de arrendamento de imóveis em moeda estrangeira, o que faz com que nesta altura em que o Kwanza perdeu força face às principais moedas estrangeiras se afastem ainda mais as famílias e os investidores nacionais deste sector que, de acordo com vários promotores e gestores, está hoje nos "cuidados intensivos", com sinais vitais muito baixos e com poucos indicadores de recuperação nos próximos tempos.
Não é que esta seja propriamente uma novidade, já que o mercado imobiliário tem estado em queda há vários anos, acompanhando a tendência da economia, que atravessou um período de cinco recessões económicas consecutivas, provocando a saída milhares de expatriados.
Segundo várias fontes do sector, esta tendência de mercado em baixa está para continuar, até porque a depreciação do Kwanza em cerca de 40% face ao dólar em apenas dois meses, compromete a ligeira recuperação económica do País verificada nos últimos dois anos. "Não está para breve o início da recuperação da estabilidade dos preços no imobiliário no curto prazo, nem mesmo do crescimento económico, apesar das projecções oficiais insistirem num cenário mais optimista", revela uma fonte ligada a uma consultora imobiliária.
Actualmente mantém-se o desnível entre a oferta (que é maior) e a procura (cada vez menor), com elevadas taxas de desocupação, bem como uma reduzida liquidez, o que tem impacto negativo nos preços, sobretudo nas rendas. No arrendamento, que segundo a legislação não pode estabelecer preços indexados a moeda estrangeira desde 2015, a verdade é que essa continua a ser uma prática normal. Com a desvalorização cambial recente os preços subiram afastando, ainda mais, a ténue procura que ainda poderia haver.
Segundo a última pesquisa de mercado da consultora imobiliária Prime Yield Angola, com a redução do número de expatriados no País, o cliente angolano passou a ser o principal impulsionador do sector, com destaque para o segmento médio, onde a oferta é significativamente grande. As dificuldades para aceder a crédito bancário pesam muito neste sector que vivia praticamente da entrada de empresas estrangeiras em Angola, o que com a crise do petróleo em 2014 foi diminuindo cada vez mais.
Álvaro Moniz, administrador do Grupo Boavida, diz que é preciso dinamizar a nova directiva do Banco Nacional de Angola (BNA) e obrigar os bancos comerciais a conceder crédito para impulsionar o sector imobiliário. Ou seja, entende que o Aviso 9 do BNA, criado antes das eleições gerais do ano passado, deve ser um passo importante para atrair mais investimentos. O gestor sublinha que a forte desvalorização do Kwanza vai retrair ainda mais o investimento no mercado imobiliário e impedir o desenvolvimento de qualquer empreendimento. Até porque num país que ainda depende muito de importações, os preços dos materiais de construção também subiram exponencialmente devido ao afundanço do Kwanza. E se o Kwanza perdeu valor face ao dólar, a própria moeda perde valor mês após devido à inflação, que na prática é um "imposto escondido", já que retira valor ao dinheiro. E por isso as famílias têm perdido poder de compra, arrefecendo o mercado imobiliário, especialmente o formal, que podia gerar receitas para o Estado por via dos impostos.
"As famílias não conseguem comprar imóveis porque os preços subiram. Um exemplo: uma casa cujo custo [de construção] seja de 30 milhões Kz e tendo em conta todas as variáveis da construção, o preço final [devido à desvalorização] hoje pode chegar aos 45 milhões, ou seja, nesta altura estamos a falar de um aumento de quase 50%, tendo em conta o mercado cambial. Estamos a falar do aumento dos custos na construção e isto impacta directamente no preço final do imóvel", explica o gestor. Álvaro Moniz apela, assim, à dinamização e ao fortalecimento do Aviso 9 do BNA como um dos instrumentos para salvar o mercado imobiliário e manter os empregos no sector, alargando os prazos de reembolso do crédito a habitação. "O Governo tem de obrigar os bancos a conceder crédito à habitação e só assim o mercado imobiliário poderá aquecer", disse.
(Leia o artigo integral na edição 736 do Expansão, de sexta-feira, dia 04 de Agosto de 2022, em papel ou versão digital com pagamento em kwanzas. Saiba mais aqui)