Os "milagres" do INE
Fica o alerta: a política económica feita com base numa folha de Excell não resultou em parte nenhuma do mundo e também não vai dar em Angola.
A publicação dos dados do emprego, com a curiosidade de mostrarem que em apenas seis meses os empregos formais cresceram mais de 818 mil, mais de 30% dos que existiam no final de Março, voltou a colocar a credibilidade do INE no centro da conversa.
Os centros de investigação universitários têm imensas dúvidas sobre estes dados, Heitor de Carvalho, da Universidade Lusíada, diz que "é absolutamente impossível" e Fernandes Wanda, da Universidade Agostinho Neto, acrescentou ao Expansão: "Estamos perante algo que não tem respaldo fora dos relatórios". Os economistas ouvidos pelo jornal afinam pelo mesmo tom. Álvaro Mendonça opina que "os dados são pouco consistentes com as evoluções em períodos anteriores" e Wilson Chimoco vai mais longe: "Estes números não parecem reais".
Este súbito desenvolvimento do País, feito nos gabinetes do INE com simples mudanças de metodologia de cálculo, cria enorme desconfiança junto dos técnicos e especialistas, que não se esquecem de reforçar que "as alterações são sempre a favor do Governo".
Em termos práticos, precisamos de ter estatísticas nacionais fiáveis e indiscutíveis, o que na verdade não acontece. As desconfianças são cada vez maiores, e numa rápida auscultação junto dos centros de investigação universitária e dos economistas que não funcionam em regime de "yes man", percebe-se que ninguém leva muito a sério estas últimas publicações.
Grande parte da culpa deste desacreditar da instituição é dela própria. Não esclarece condignamente, não envolve as universidades e os especialistas, não explica convenientemente todas estas alterações e porque é que aconteceram estes "milagres" nesta altura.
Queria, desde já, dizer que não significa que não seja mesmo assim, que a realidade não esteja longe destes últimos números, mas isso tem de ser muito bem explicado. Isto porque há cada vez mais pessoas com capacidade técnica desenvolvida, com análise crítica e que "não comem todo o funge que lhe põem à frente sem perceber de onde vem a farinha".
O que é engraçado, caricato, é que aparecem sempre uns "especialistas" nos meios de comunicação social pública a festejar estes avanços da governação sem questionar como se chegou a estes números, que aliados às milícias digitais alinhadas com a "situação", enchem o ego dos responsáveis por esta estratégia. Eles acreditam mesmo que a economia angolana cresceu 4,1% no I trimestre do ano, que a inflação em Luanda baixou 21 pp em 12 meses e que agora, nos últimos seis meses, foram criados mais de 818 mil empregos formais.
Como conhecem pouco a realidade do País, circulam em carros de vidros fumados, vivem em condomínios ou vivendas nas zonas nobre da capital, dão-se entre si, numa mesma classe e com pessoas com as mesmas características, não lhe parece estranho que todo este crescimento dos números não resulte numa melhor vida para os cidadãos. Também raramente incluem vozes discordantes nas suas consultas e, mesmo que isso aconteça, acham que são apenas pessoas que dizem sempre mal, que estão mal resolvidas ou que são antipatrióticas.
Mas, caríssimos, fica o conselho - é necessário falar e explicar os factos à sociedade civil, ao meio académico, à população de um modo geral, porque a indignação rapidamente se torna em rejeição e depois não há mais espaço para restabelecer a confiança. E mais um alerta, a política económica feita com base numa folha de Excel não resultou em parte nenhuma do mundo e também não vai dar em Angola.













